segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

A ILUSÃO E SEDUÇÃO DO PODER

*Padre João Medeiros Filho 



Estão previstas para o segundo semestre de 2018 eleições em nível federal e estadual. Serão escolhidos deputados, senadores, governadores e presidente da república. Para muitos, época de corrida em busca do poder. A bem-aventurada Irmã Dulce dizia que “ninguém administra digna e eficazmente, se não cultivar a virtude da humildade”. Eis uma das raras definições de Cristo a seu respeito: “Aprendei de mim que sou manso e humilde” (Mt 11, 29). A humildade torna-nos mais humanos, mostrando nossas limitações e fragilidades, que dificultam ou impossibilitam mudanças de atitude. É preciso que ela exista, tanto no cidadão comum quanto nos que exercem cargos elevados. “Sem ela, não haverá líderes autênticos”, declarou recentemente o papa Francisco, em audiência a um chefe de estado. É o primeiro passo para a sabedoria, que permite encontrar saídas para as crises e expressar sensibilidade para definir o que realmente é certo e prioritário. 


O Brasil necessita urgentemente de verdadeiras lideranças, pessoas abertas a novas percepções e posturas políticas, dispostas a avançar sob o impulso do diálogo e da ética. Estes são antídotos contra a mediocridade de desempenhos e a pobreza de propostas daqueles que, em vez de pensar no bem comum, são orientados por partidarismos deletérios. 

Um tempo novo, um Estado reconstruído, uma sociedade equilibrada, capaz de superar tristes cenários, serão edificados, a partir dos pilares da humildade, da crítica e da ética. Deste modo, é mais fácil chegar à superação da nefasta cultura, que caminha na contramão da transparência e da honestidade. Assim é possível orientar condutas e neutralizar o famoso “jeitinho brasileiro”. Este consiste especialmente na falta de seriedade, no costume de burlar normas e procedimentos, com o objetivo de alcançar vantagens pessoais e para aqueles que lhes são próximos ou correligionários. 

Somente os éticos e humildes conseguirão transformar a sociedade. Infelizmente para tantos, o poder é a suprema ambição, a maneira de se comparar a Deus. Segundo alguns teólogos, a megalomania de Adão e Eva, na metáfora bíblica do Livro do Gênesis, mostra o primeiro pecado da humanidade. “Queriam ser iguais a Deus” (Gn 3, 5). 
Há políticos que gastam somas milionárias (dinheiro talvez subtraído das necessidades do povo) em campanhas eleitorais. Mesmo derrotados, voltam à cena. A sede hegemônica parece proporcional à fortuna que dilapidam. Sentem-se frustrados, expulsos do Olimpo dos deuses, quando ficam fora dos postos de mando. Caem em depressão e, passada a ressaca, voltam à disputa com menos escrúpulos. 

O exercício do poder modifica, em muitos, o modo de pensar, viver e agir, operando em certas pessoas uma transformação psicológica, social e cultural. Quantos se realizam e são felizes, cercados de bajuladores, convites e homenagens, rodeados de assessores e desfrutando de uma infraestrutura que os reveste de uma aura especial. Chegam a trocar de carro, casa, amigos e até de cônjuge. Jactam-se em aprovar projetos, liberar recursos, autorizar e inaugurar obras, permitir viagens, distribuir cargos, promover pessoas e conceder benesses. 

Não raro, quem galga e se apega a postos de alto escalão só admite elogios. As críticas minam sua autoimagem e exibem suas contradições. Daí, os poderosos formarem um círculo hermético, acessível apenas aos que seguem suas ideias e cumprem suas ordens. Por que o poder encanta tanto? Em geral, alimenta os medíocres, que gostam de ser incensados. Seu ego necessita de uma máscara ou cortina de fumaça. Ele já está latente na alma de muitos e revela o seu caráter. Isso acontece desde os dignitários do país aos que exercem funções mais simples. São poucos os que agem como Cristo ensinou, a serviço do bem, da justiça, da solidariedade e da paz. “Entre vós não deverá ser assim. Quem quiser ser o maior, seja aquele que vos serve. Quem quiser ser o primeiro, seja vosso servidor. Pois, o Filho do Homem veio não para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para o bem de muitos” (Mt 20, 26). Há governantes, políticos, religiosos e autoridades que se servem do povo e não servem ao povo. Convém lembrar bem disso nas próximas eleições.



* É membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.



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