sábado, 30 de abril de 2011

GARRAFINHAS DE AREIA COLORIDA

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG, membro do IHGRN ) www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br

AINDA SOBRE AS GARRAFINHAS DE AREIA COLORIDA

Da última vez que estive na residência do poeta Deífilo Gurgel, entre uma conversa e outra, disse-lhe que estava fazendo uma pesquisa, para escrever um artigo sobre a origem das garrafinhas de areia colorida. Na ocasião ele lembrou-se haver lido uma plaqueta feita por Veríssimo de Melo, que tratava do assunto e fazia referência à praia de Tibau do Norte.

Procurei então o meu amigo e contemporâneo do velho Atheneu Norte-Riograndense, Fernando de Melo, filho de Veríssimo. Por sorte depois de algumas buscas ele encontrou e me enviou a tal plaqueta, intitulada GARRAFINHAS DE AREIA DE TIBAU. Essa pesquisa foi feito em 1962 e publicado pela Coleção Mossoroense em 1983, com desenhos e capa de Newton Navarro. Transcrevo na íntegra as anotações, para conhecimento dos leitores,.

“O presente trabalho sobre as areias de Tibau foi feito pelo Diretor do Departamento de Cultura Popular do Instituto de Antropologia da Universidade do Rio Grande do Norte, Prof. VERÍSSIMO DE MELO. Atendendo solicitação do Sr. LUIZ G.M. Bezerra, presidente da Federação Norte-Riograndense de Pesca Amadora, vai agora publicar especialmente para acompanhar as amostras das garrafas de areia que foram enviadas, como lembrança de nossa terra, ao IV Congresso Sul-Americano de Pesca, em Asunción, Paraguái.”

Relata o professor Veríssimo: “O aproveitamento de vasilhame com enchimento de objetos ou cobertura externa com palha ou fibra, com finalidade de ornamentação doméstica, é processo conhecido entre as manifestações da Arte Popular brasileira.

Da Bahia, conhecemos as garrafas com pequenos veleiros metidos lá dentro. Da Paraíba, vidros com santos. Do Pará, lindas garrafas cobertas com fibras de várias cores. Do Rio Grande do Norte, talvez a mais original de todas as nossas atividades artísticas populares seja o enchimento de garrafinhas com areias coloridas de Tibau.
Verdadeiras obras de arte, pelos seus desenhos, distribuição e variedades de cores, essas garrafinhas de areia são muito estimadas como elementos decorativos. Vendidas nos mercados e feiras do Estado, representam curiosidade sui-generis para visitantes ou turistas, que nunca as dispensam como lembrança de nossa terra.

Praia de pesca e veraneio, pertencente hoje ao município de Grossos, extremo-norte do nosso Estado, vizinha do Ceará, Tibau é também recanto pitoresco preferido pelos veranistas do próspero município de Mossoró.
Lá estivemos em julho de 1962, a serviço do Instituto de Antropologia da Universidade do Rio Grande do Norte, tendo oportunidade de observar e conversar com exímia fabricante dessas garrafinhas. Colaborou conosco o Dr. Tércio Miranda Rosado, nosso cicerone e que nos forneceu dados mais amplos sobre o assunto, através de questionário e contacto direto com moradores daquela praia.

AS AREIAS

As areias são retiradas das dunas, que estão bem à vista, diante da praia. Algumas tonalidades são retiradas das camadas superpostas, no subsolo. Sua variedade de cores é impressionante: vinte e cinco tonalidades podem ser colhidas facilmente. Segundo nos informou Josefina Fonseca, são as seguintes as cores de areia de Tibau. Amarelo, Marrom, Preto, Prateado, Cinza, Cinza-Claro, Cinza-Escuro, Encarnado, Encarnado-Escuro, Encarnadão, Areia, Róseo, Verde-Claro, Verde-Escuro, Laranja, Roxo, Roxo-Clara, Roxo-Escuro, Amarelo-Claro, Amarelo-Queimado, Creme, Grená, Branco, Branco-Goma e Cáqui.

Não conhecemos outras aplicações da natureza artística ou industrial das areias de Tibau, a não ser o que nos informou o Dr. Tércio Miranda Rosado: Seu tio Dr. Vingt-Um Rosado usou duas variedades de cores dessas areias na construção de um cinema, em Mossoró. Por outro lado, soubemos que norte-americanos teriam declarado, a respeito das areias de Tibau, que uma das variedades seria semelhante às que foram encontradas na Barra do Ceará (Fortaleza) e Aracati, inflamáveis ao contato de um cigarro aceso.

UMA ARTESÃ

Josefina Fonseca, com quem conversamos, fabricante de garrafinhas de areia, é senhora de quarenta e poucos anos de idade. Aprendeu a técnica do enchimento, há trinta anos, com sua tia Belisa, e logo se aperfeiçoou. Informou-nos que outras pessoas de sua família e moradores da praia também se dedicam a mesma atividade, mas unicamente mulheres.
Mulata escura, Josefina é pessoa bastante cordial, tendo prontamente nos atendido, quando lhe pedimos para encher uma garrafinha em nossa presença.

A TÉCNICA

Josefina foi lá dentro de casa e trouxe vários pacotes de papel, contendo areia de várias cores. Sentou-se no chão, no terraço, pondo de lado uma garrafa vazia (tipo vinho branco), e um arame um pouco maior, talvez de uns quarenta centímetros de ponta a curva.

Inicialmente, apanhou um punhado de areia alaranjada, com a mão direita, despejou-o, lentamente, pelo gargalo da garrafa. Munida do arame, começou a fazer uma série de movimentos por dentro do vasilhame, em sentido circular. Após delinear o primeiro desenho, - um animal – colocou novo punhado de areia e repetiu o mesmo desenho, agora já noutra cor. Seguiram-se, então, nove cores ao todo, nesta ordem: Alaranjada, branca, preta, marrom, grená, cinzenta, roxo e róseo. Em menos de meia hora concluiu o seu trabalho, enchendo uma garrafa de litro, dividida em doze camadas de areia, com o mesmo desenho.

Os motivos artísticos que escolhe não são feitos arbitrariamente. São desenhos tradicionais, que aprendeu de Belisa. Por sua vez, esta já aprendeu de outras pessoas. Uns são mais fáceis de executar, outros mais difíceis. Os motivos que considera mais complicados são os que aparecem “peixinhos” ou “Passarinhos”.
Outro detalhe de técnica interessante é a distribuição das cores nas garrafas. Também não é feita à vontade. Obedece a um padrão tradicional: Cor clara, de início, e cor mais escura em seguida.

A propósito, o escritor cabo-verdeano Luiz Romano, que viveu mais de treze anos no Marrocos francês, tem apontado semelhanças dos desenhos e distribuições de cores entre as garrafinhas de Tibau e trabalho árabes, principalmente tecidos, colchas de lã, como teve ocasião de nos mostrar. Aliás, não só nessa atividade artística Luiz Romano tem encontrado paralelismo com traços culturais muçulmanos. Em muito outros aspectos da vida nordestina. Influência que teria sido trazida pelos portugueses, na colonização.

MULHER DE AREIA

Em meia hora, como vimos, Josefina enche uma garrafinha com areia de Tibau, artisticamente. Em média, confessou-nos que poderá preparar vinte garrafas por dia.
Em 1932, quando iniciou o aprendizado, cobrava por uma garrafa de areia cinco mil réis. Hoje, o preço normal é de cem cruzeiros por cada unidade. Entretanto, cobra cento e cinqüenta cruzeiros para encher certo tipo de garrafa de licor estrangeiro, em forma de mulher. É dos trabalhos mais interessantes de Josefina, pois a mulher de areia aparece com saia bordada, casaco de outra cor, rosto, olhos, cabelos, tudo colorido. É obra de arte e de paciência.

Também muito procuradas são as garrafas contendo nome de mulher ou expressões significativas, como “Lembrança de Tibau”, “Saudade”, etc.

UMA SUPERTIÇÃO

A perfeição do enchimento de garrafas em Tibau é de tal ordem que provocou, certa vez, atitude estranha de um cidadão: Para certificar-se de que era mesmo areia e não tinta comprou uma garrafa e espatifou-a no chão. Convenceu-se, então. Todavia, - informou-nos Josefina – alguns fabricantes, ultimamente, tem tinturado duas tonalidades de areia, para obter uma terceira. A prática tem provocado protesto de admiradores da manifestação artística. Consideram estas falsificadas.
Curioso! Se toda atividade profissional tem suas superstições, é natural também que o fabrico das garrafinhas tenha a sua: E dizem, então, que a areia de Tibau, engarrafada, da azar! Mas, isso é folclore”.

Diante desse documento do Professor Veríssimo, podemos concluir que as “Garrafinhas de Areia Colorida” surgiram em locais e épocas diferentes, nos vizinhos e irmãos estados do Rio Grande do Norte e Ceará. Porém, temos em comum a existência dessas areias coloridas tanto na praia de Majorlância-CE como na Praia de Tibau do Norte-RN, o que foi determinante para a iniciação dessa arte.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

FRAUDE - A INDIFERENÇA DOS BANCOS

Bom dia!
Muito boa sua iniciativa em alertar os usuarios, ou seja todos nos. Deveriamos nos unir e exigir das instituições financeiras melhores serviços e menos taxas.

Um forte abraço!

Isac Galvão
Natal/RN

FRAUDE - A INDIFERENÇA DOS BANCOS

Senhor Ormuz,

Eu fui pega nesse golpe em um dos caixas do Midway Mall.
Jamais desconfiei que era uma fraude, pois apenas tinha ouvido falar do "chupa cabra", mas não sabia como funcionava, pensei que roubassem apenas informações como senhas.
Concordo com o senhor, os bancos podiam avisar os clientes, mas não estão interessados, pois, segundo funcionários do próprio banco, as fraudes com cartões de crédito e cheques são descobertas depois e não há prejuízo financeiro para o cliente. Discordo, pode até não haver prejuízo financeiro, mas e o estresse e dano psicológico de ficar sem o cartão, não conseguir tirar o dinheiro etc?

Parabéns pela iniciativa do artigo.
Também divulgarei em redes sociais para evitar que outras pessoas caiam no golpe.

Ana Cristina Ávila Paz

segunda-feira, 25 de abril de 2011

FRAUDE - A INDIFERENÇA DOS BANCOS

Parabéns pela sua diligência.
A indiferença geral é que faz proliferarem estas fraudes.
Não é só o Banco que é indiferente.
A maioria das pessoas pouco se importa se se depara com alguma coisa estranha ou diferente e não toma
qualquer medida para evitar que outras pessoas sejam atingidas.

José Augusto de Souza
Garanhuns-PE

FRAUDE - A INDIFERENÇA DOS BANCOS

É bom tomar cuidado nos caixas automáticos. Se ficar retido na máquina, é tentativa de roubo do cartão!!!. O negócio é chamar a polícia (pelo celular), sem se afastar do local, para não deixar o cartão ser levado pelo malandro...
Talvez uma placa chumbada à frente/no alto do caixa automático possa alertar o usuário...
"Seu cartão ficou preso?
Não saia. Chame a polícia".


Abrs...

Luiz Bissoli

FRAUDE - A INDIFERENÇA DOS BANCOS







ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG, membro do IHGRN )www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br

Matéria publicada no periódico “O JORNAL DE HOJE” edição de 25 de abril de 2011

CHUPA CABRA – POR QUE OS BANCOS NÃO ALERTAM SEUS CLIENTES?

Nessa última sexta-feira, por pouco não fui mais uma vítima desse golpe que vem se proliferando nos terminais de auto-atendimento das agências bancárias. Pela manhã, fui até o hospital PAPI levando meu neto para uma consulta, pois havia passado a noite anterior com muita febre. Deixei minha esposa com ele em frente ao hospital, e como não havia onde estacionar, prossegui e estacionei o carro em frente à agência do Banco do Brasil da Av. Afonso Pena. Como já estava em frente ao Banco, aproveitei para fazer alguns pagamentos.

Logo que adentrei a área onde se encontram as máquinas de auto-atendimento, notei que havia poucos clientes, fato justificado em virtude de ser um dia feriado. Dirigi-me para uma das máquinas e ao introduzir o cartão, coincidentemente, apareceu uma mensagem dizendo haver problemas com a leitura do cartão.

Logo em seguida um indivíduo se aproxima de mim e solícito informa: “somente as duas primeiras máquinas estão funcionando”. Olhei de relance para a pessoa que me prestava à informação, agradeci, e dirigi-me para as máquinas que ela havia indicado. Ao introduzir o cartão no local adequado, este foi totalmente engolido. Por mais que tentasse não consegui retirá-lo do local. Após várias tentativas sem êxito, resolvi telefonar para os números que apareciam na tela da máquina. Fiz várias ligações, infelizmente não consegui fazer contato com ninguém, pois as ligações não se completavam.

Comecei a ficar preocupado, pois havia deixado meu neto no hospital, com possibilidade de ter contraído dengue e fiquei de retornar logo após estacionar o carro. Naquele instante decidi que não deixaria meu cartão preso naquela maquia e resolvi apelar para a força bruta. Bati forte com o punho fechado na peça que prendia o cartão e logo notei que a mesma cedeu um pouco para a lateral. Naquele instante percebi que tinha sido vítima de uma tentativa de fraude.

Daí pra frente foi fácil perceber que estava diante do famoso golpe do “chupa cabra”. Com dificuldade, retirei a peça que é uma cópia perfeita da existente na máquina que encaixa perfeitamente sobre a original. Como está sobreposta, aumenta o ambiente interno e quando o cliente introduz o seu cartão, este desaparece totalmente no espaço vazio, impedindo a recuperação.

Imediatamente telefonei para a polícia e comuniquei o fato. Minutos depois uma viatura compareceu ao local com três policiais e apreenderam o equipamento. Naturalmente, o meliante, percebendo a movimentação policial evadiu-se. Com toda certeza, ele deveria encontrar-se próximo da agência, me observando, para que logo que saísse se apossaria do cartão.

O que mais me impressiona, é a pouca importância que os Bancos dão a esse tipo de golpe. Esse procedimento criminoso deve acontecer por diversos estabelecimentos bancários, principalmente nos fins de semana e feriados quando o correntista, ao ser lesado, não tem a quem recorrer. Centenas de clientes já devem ter caído nesse golpe, em virtude da simplicidade do equipamento e a facilidade com que eles são colocados pelos golpistas.

Uma medida simples, mas que a meu ver traria resultados imediatos eram os estabelecimentos bancários informarem aos seus clientes o “modus operandi” desses golpistas, através de pequenos cartazes apostos nas salas de auto-atendimento. Com isso os clientes pelo menos tomariam conhecimento, e em casos com o que relatei, possam resolver o problema apenas retirando o equipamento criminoso.
Ora, ora. Como bancário aposentado e acostumado a freqüentar estas salas, sabia que naquele tipo de máquina, não havia a mínima possibilidade de o cartão ser engolido e, desconfiado da fraude, apelei para força física. Por sorte, consegui reaver meu cartão e desmontar a armadilha.

Este artigo tem por finalidade alertar a população para esse tipo de fraude, já que as instituições financeiras que são responsáveis pela segurança de seus clientes quando adentram as suas instalações, não o fazem. Entretanto os golpistas podem ser facilmente identificados. Basta que os gestores examinem as fitas de gravação dos equipamentos instalados nas agências, e os identifiquem no momento em que atuam na instalação desses equipamentos fraudulentos.

domingo, 17 de abril de 2011

A PÉROLA RARA

A PÉROLA RARA

Ó paraguaia pérola de marisco
Serias uma exótica raridade?
Ou singela obra do acaso?
Fruto promíscuo duma panela
Onde repousou de ostra, um caldo
e como resíduo aportaste ufana
noutro viscoso e similar petisco!
Qual seja o caldo duma ostra grega
Pródiga em pérolas alvas e brilhantes
Que surgiu qual presente do Olimpo
Para o brilhante ateniense Ormuz.

15 de abril de 2011 11:28

José Augusto

sexta-feira, 15 de abril de 2011

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG, membro do IHGRN da UBE-RN e ACLA) – www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br

PUBLICADO NO PERIÓDICO “O JORNAL DE HOJE” EDIÇÃO DE 15.04.2011

























A PÉROLA RARA

Na última vez que estive na Praia da Pipa, recebi em minha casa o casal Levi e sua esposa Ana Lucia. Levi é o filho mais novo do saudoso vereador Dioclécio Sérgio de Bulhões, e sua esposa, também nascida de boa cepa, é filha de Ivanildo José da Silva, o Ivanildo Sax de Ouro, pernambucano de nascimento e potiguar por opção.
O meu amigo Levi, considerado por seus pares um dos melhores artistas plástico dessa aldeia de Poti, tem seus trabalhos espalhados por vários Estados de nossa federação, inclusive em outros países. Nessa breve visita, onde retornou a Natal no mesmo dia, aproveitou para observar, com olhos de artista, as belas paisagens da Pipa. Essas observações são fundamentais para dar continuidade ao trabalho de ilustração do meu próximo livro, “A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS”, que ele vem desenvolvendo, desde o ano passado.

O livro será lançado ainda este ano com o selo editorial “NAVE DA PALAVRA”, da UBE-RN - União Brasileira de Escritores, secção Rio Grande do Norte. O trabalho será composto por 30 ilustrações que retratam toda a história da praia da Pipa de antigamente. Nesse trabalho, o artista optou por utilizar a técnica mista, que junta na mesma gravura o bico de pena e a pintura acrílica. Já estou de posse de alguns desses trabalhos e posso adiantar que aos meus olhos e de minha família ficaram como esperávamos: um belo trabalho, a altura do talento do artista.

Foi um dia maravilhoso onde tivemos a oportunidade de recordar nossas travessuras de adolescentes quando eu freqüentava a “turma da Princesa Isabel”, rua onde ele morava. Nessa época, costumávamos a nos reunir em frente à Bodega de Floriano, que ficava nas esquinas das ruas Apodi com a Princesa Isabel. Essas reuniões deram origem a “Confraria de Floriano”, onde anualmente, no mês de novembro, reúnem-se na residência de um dos “confrades”, os integrantes da época para matar um pouco a saudade do tempo que passou, mas isso é outra história que contarei depois.
Como sabia que o casal era apreciador de um bom caranguejo cozinhado no leite de coco, encomendei no dia anterior três cordas de goiamum. Aproveitei a oportunidade para juntar a encomenda 1 Kg de marisco, que igualmente vai muito bem ao tempero.

Essa iguaria se constitui, na minha modéstia opinião, o mais gostoso caldo para tira-gosto, principalmente quando a bebida é uma brasileiríssima cachaça. Esses moluscos, muito utilizados em nossa culinária de frutos do mar, são pequenos animais marinho encontrados principalmente em áreas de manguezais. Os que compramos, foram colhidos nos mangues da Lagoa de Guaraíras. Verdadeiras fontes de nutrientes essenciais, eles são ricos em vitamina B, B1, B2, zinco, selénio, cálcio, magnésio e iodo.

Como o casal não pôde nos visitar no sábado, dia em que os esperávamos, perderam a oportunidade de saborear o goiamum ao leite de coco, feito com todo o carinho pela minha esposa, que tem a habilidade tanto de fazer como de degustar esses crustáceos. Os recebemos então no dia seguinte, e como recompensa, guardei para o casal o sururu que foi servido apenas no domingo, como tira-gosto, em forma de caldo.
Lá pelas tantas, entre um copo e outro, conversávamos amenidades. Ele, grande apreciador de cerveja, sorvia cada copo como se fosse o último. Por minha vez, como de costume, preferi degustar em pequenos goles, uma boa cachaça.

Estávamos em animada conversa quando foi servido o caldinho de sururu ao leite de coco. Logo na primeira porção que me foi servida, mastiguei algo estranho. A princípio pensei tratar-se de uma pedra e temi pela possibilidade de ter quebrado algum dente. Mas, ao colocar a mão na boca e retirar aquele corpo estranho, surgiu diante dos meus olhos algo bem diferente do que esperava ver. Fiquei observando na ponta de meu dedo indicador uma bela e minúscula pérola. A princípio não acreditei no que meus olhos viam, ao tempo que meu celebro insistia no que me recusava a acreditar. Até aquela data nunca tinha ouvido falar que alguém tivesse encontrado uma pérola dentro de um marisco, mesmo porque não era de meu conhecimento que fosse possível encontrar pérolas dentro desses moluscos. Sempre ouvia falar que elas são encontradas dentro de ostras.


























Estudando o assunto descobri que as pérolas são materiais orgânicos produzidos por moluscos, principalmente pelas ostras. Formam-se a partir de vermes ou grãos de areia que invadem seu organismo. Valorizadas como gema desde a antiguidade, a jóia é objeto de desejo das mulheres, e sinônimo de glamour. As pérolas de melhor qualidade são encontradas no Golfo Pérsico, porém também são encontradas na Índia, América Central, Austrália e Sri Lanka. No Japão, as que são “cultivadas” em criatórios, a produção é em larga escala, mas o preço é bem inferior. Nesta região e na Coréia, desde a antiguidade, existe um grupo de mulheres apneístas – que consegue prender a respiração por bastante tempo - especialistas na caça de pérolas a grandes profundidades.

O confrade e amigo Edgar Ramalho, geólogo e especialista em gemas, ao ver a notícia juntamente com a foto da pérola no meu blog – www.ormuzsimonetti.blogspot.com, pediu-me para analisá-la. Na última terça-feira, dia 12, levei-a até ele que após minucioso análise comprovou sua autenticidade.
Pois bem, na ocasião o achado causou espanto a todos os presentes e imediatamente lembrei-me de minha filha caçula Priscilla, que havia ficado em Natal. Estava impossibilitada de viajar, pois aguarda para qualquer instante partilhar do milagre da vida, com o nascimento da doce Isabella, sua primeira filha e minha segunda neta.
















Essa pérola, que chegou a mim de uma maneira tão inusitada, certamente foi enviada por interseção de Maria mãe de Deus, de quem é extremamente devota, que cheia de graças, se antecipa em presentear essa outra pérola que logo vai chegar a um mundo de incertezas, mas que terá Sua proteção e o amor incondicional de seus familiares.

Parafraseando o poeta cantor e compositor Chico Buarque de Holanda, desejo que ela seja “pura como o grito mais profano, com a graça do perdão. E que ela faça vir o dia, dia a dia mais feliz e seja da alegria sempre uma aprendiz”.

Natal, 05 de abril 2011.


Em tempo: Isabella nasceu ontem dia 15 com 3,1 kg. Linda e saudável.

terça-feira, 12 de abril de 2011

AS LIÇÕES PERMANENTES DA VIDA




O QUE É VIVER BEM?


Um repórter perguntou à CORA CORALINA (poeta que viveu até 95 anos) o que é viver bem?
Ela disse-lhe: “Eu não tenho medo dos anos e não penso em velhice. E digo prá você, não pense. Nunca diga estou envelhecendo ou estou ficando velha. Eu não digo. Eu não digo que estou ouvindo pouco. É claro que quando preciso de ajuda, eu digo que preciso.

Procuro sempre ler e estar atualizada com os fatos e isso me ajuda a vencer as dificuldades da vida. O melhor roteiro é ler e praticar o que lê. O bom é produzir sempre e não dormir de dia.
Também não diga prá você que está ficando esquecida, porque assim você fica mais. Nunca digo que estou doente, digo sempre: estou ótima. Eu não digo nunca que estou cansada. Nada de palavra negativa. Quanto mais você diz estar ficando cansada e esquecida, mais esquecida fica. Você vai se convencendo daquilo e convence os outros.
Então silêncio! Sei que tenho muitos anos. Sei que venho do século passado, e que trago comigo todas as idades, mas não sei se sou velha não. Você acha que eu sou?

Tenho consciência de ser autêntica e procuro superar todos os dias minha própria personalidade, despedaçando dentro de mim tudo que é velho e morto, pois lutar é a palavra vibrante que levanta os fracos e determina os fortes.
O importante é semear, produzir milhões de sorrisos de solidariedade e amizade. Procuro semear otimismo e plantar sementes de paz e justiça.Digo o que penso, com esperança. Penso no que faço, com fé. Faço o que devo fazer, com amor.Eu me esforço para ser cada dia melhor, pois bondade também se aprende.”

Cora coralina morreu em 1985 aos 95 de idade, cuidou do seu interior mais do que seu exterior, tinha todas as linhas da vida no rosto, e que vida !
Xô Botox! Viva as linhas de expressão e da vida!

Do blog de Carlos Roberto de Miranda Gomes

sábado, 9 de abril de 2011

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG, membro do IHGRN da UBE-RN e ACLA) – www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br


Publicada em “O JORNAL DE HOJE” edição de 08/04/2011

A ARTE DA CICLOGRAVURA


Até esta data, nunca tinha tido a curiosidade de saber como haviam surgido as “garrafinhas de areias coloridas”. Qual era sua história, quem as tinha criado e como havia acontecido.
Há várias décadas que encontramos à venda. Essa arte que é feita dentro de garrafas ou outros recipientes translúcidos, utilizando apenas areias coloridas, longos palitos e uma porção enorme de talento.

Desde sua criação, essa obra é bastante difundida aqui no nordeste, principalmente no Rio Grande do Norte e Ceará, berço de seu criador, onde diversos artesãos ganham seu sustento com a produção e venda dessas peças. Seus principais pontos de vendas são os quiosques próximos as praias, em mercados de artesanatos, centros turísticos etc., além de serem muito exportadas para o centro-sul do país e até mesmo para o exterior.

O preço varia de acordo com o tamanho do recipiente, e também com a complexidade do desenho. Quanto mais elaborado, maior o seu preço. As peças menores giram em torno de R$ 10,00 por unidade. Quanto às maiores, podem chegar a custar até R$ 1.000,00, ou mais. Algumas são tão perfeitas que chegam a ser confundida com uma pintura. Custa a acreditar que são feitas apenas com areias multicoloridas, paciência e muita habilidade.


BOBO EM PLENA ATIVIDADE

Como acontece há vários anos, eu estava na praia da Pipa, por ocasião dos festejos carnavalescos. Aliás, desde o mês de novembro que estou “veraneando”, - privilegio dos aposentados – quando certa ocasião, passando ao lado da Igreja Católica em direção a rua de cima, vi um artesão trabalhando na confecção das garrafinhas. Ele estava sentado em um banquinho, abrigado do sol por uma surrada sombrinha de praia, concentrado em seu lavor. Por diversas vezes já o tinha visto naquele mesmo local, porém, desta feita resolvi me aproximar. Com uma das mãos segurava a peça de vidro e com a outra, ia aos poucos, derramando porções de areias muito finas e de diversas cores, que retirava de pequenos recipientes, dispostos em cima de um tabuleiro. A todo instante derramava um pouco daquelas areias dentro do vidro e com um fino palito, dava formas a paisagem que pretendia fazer. Naquele momento reproduzia o que trazia em sua mente: morros, coqueiros, barcos na linha do horizonte, uma casinha de palha. Tudo muito bem harmonizado, acompanhando a forma circular dentro daquela pequena garrafinha.


















Parei para observar o artista em plena criação. Era um trabalho lento, de muita paciência, e habilidade com as ferramentas rudimentares que utilizava. Mas, acima disso tudo, observava o talento para reproduzir através da arrumação dos vários tons de areia, a paisagem por ele imaginada ou às vezes, que fora previamente encomendada por alguém.



Como gosto de observar as pessoas no seu cotidiano, fiquei a apreciar o seu trabalho. Por ser muito cedo, e ainda não havia movimento na rua, achei que seria um bom momento para iniciar uma conversa. Tive o cuidado de deixá-lo completamente à vontade, pois temia que minha atitude atrapalhasse o seu trabalho. Assim deixei que ele decidisse se estava interessado em continuar o bate-papo, ou não. Logo que o cumprimentei, fui surpreendido com sua enorme vontade de conversar. Apaixonado pelo seu trabalho e ávido para falar de sua história e da sua arte, conversava sem parar, porém, suas mãos habilidosas continuavam a executar sua criação. Aos poucos ia surgindo dentro daquele cilindro de vidro, que estava se reciclando por já ter cumprido sua finalidade inicial, a bela paisagem de uma praia que existia somente na imaginação do artista.

Todos o conhecem por Bobô, apelido que traz de sua infância na cidade de Aracati, no Ceará, onde nasceu. Mora na praia da Pipa há algum tempo. Chegou ao nosso Estado em 1991, trazido por sua mãe que era parteira numa cidade do interior do Ceará e veio para o Rio Grande do Norte contratada para exercer a mesma função, na cidade de Nísia Floresta.

Um dia Bobô resolveu conhecer a praia da Pipa, informado que por aqui passavam muitos turistas, o que lhe oportunizaria a venda de um maior número de suas garrafinhas. Seguindo o exemplo de outros que por aqui chegam e “encalharam”, nunca mais voltou.



















Ele contou que esta arte maravilhosa praticada por ele, que é responsável, desde sempre, pelo seu sustento e de sua família, é denominada de ciclogravura - confecção de gravuras em garrafas utilizando areias coloridas -, e que surgiu na década de 50, na praia de Majorlândia, no Ceará. Em seu relato afirmou que havia uma senhora por nome de Joana Carneiro, que enchia garrafas com areias de diversas cores, colhidas nos morros da região. Ao enchê-las, alterava as cores em formas circulares, com espaços em torno de dois centímetros para cada porção de areia colocada. Presenteava as pessoas e às vezes chegava a vender para visitantes que chegavam de Fortaleza para passar temporada de veraneio.

Certa vez, fazendo esse trabalho, encheu um litro com as tais areias quando, momentos antes de concluir o trabalho, o litro virou. Como o recipiente ainda não estava completamente cheio, as areias se projetaram para o lado e acidentalmente formou um desenho, que aos olhos de seu filho, presente na ocasião, pareceu-lhe uma paisagem.

O filho dessa senhora se chamava Antônio Eduardo Carneiro, que tempos depois ficou conhecido como “Toinho da Areia Colorida”. Dias depois ao tentar reproduzir uma paisagem dentro de uma garrafa, utilizando as areias coloridas, descobriu que tinha habilidade para “desenhar com as areias” o que estava em sua mente. Surgia nessa ocasião um grande e talentoso artista. Daí pra frente nunca mais parou.
Diante desse relato, podemos dizer que foi ele o precursor dessa arte tão difundida em todo o litoral nordestino. Hoje, do auto dos seus quase 80 anos de idade, raramente trabalha na confecção dessas garrafinhas, que apesar dessa denominação, outros recipientes também são utilizados na sua confecção como: cálices, tulipas, bojos e vários outros tipos e formas de invólucros, desde que de vidro transparente e sem cor, para que as cores das areias sejam apreciadas com toda fidelidade.
A grande maioria das areias que são utilizadas nesse trabalho tem sua coloração feita pela natureza. Somente a cor verde e azul é produzida a partir da areia de cor branca, com adição de corantes. Os tons mais claros ou escuros são obtidos a partir da mistura das cores existentes.



Toinho, como é conhecido, deixou sua marca mais visível em frente à pousada “Refugio Dourado”, na praia de Majorlândia-CE, ao fazer duas esculturas gigantes, aproveitando uma barreira situada ao lado da pousada.
Assim como aconteceu com o Mestre Vitalino, de Caruaru, criador dos mundialmente famosos bonecos de barro, sua arte inicialmente foi repassada para vários de seus descendentes e familiares. Hoje sua técnica é conhecida por inúmeros artesãos, principalmente no nordeste, aonde alguns chegaram até mesmo a aprimorá-la.
Esses artífices costumam produzir seus trabalhos a vista do público, artifício que utilizam para atrair a atenção dos transeuntes e facilitar as vendas. Com um pouco de sorte, conseguem, vez por outra, alguma encomenda de maior porte.
Esses artesãos são encontrados com certa facilidade principalmente nas praias do Rio Grande do Norte e Ceará, próximos aos pontos de venda. Certa vez, em Fortaleza, tive a oportunidade de ver, numa feirinha que ficava na orla marítima em frente ao hotel que eu estava hospedado, um desses trabalhos exposto a venda, que me causou admiração. Em um recipiente redondo com média de 30 cm de diâmetro por 15 cm de altura, o artista tinha retratado uma onça pintada (panthera onça), símbolo da fauna brasileira, bebendo água em um riacho no meio de uma floresta tropical. A perfeição na reprodução da pelagem daquele animal era algo extraordinário. Fiquei maravilhado com a técnica com que o artesão conseguiu reproduziu utilizando somente as areias coloridas, aquele animal dentro de seu habitat natural.


























A exemplo de outras descobertas como o Raio X (1895); a Penicilina (1928); os três adoçantes artificiais, largamente utilizado pelo sexo feminino na constante luta por uns quilinhos a menos, ciclamato (1937), aspartame (1965) sacarina(1879); o forno microondas (1946), a borracha vulcanizada (1836) e mais recentemente o Viagra, alegria e realização de muita gente que a muito já havia perdido a esperança (1992), todas foram feitas por acaso. As belas garrafinhas de areias coloridas, infinitamente menos importante, mas que alegram os olhos de turistas de todo o mundo, também nasceu de uma casualidade aliada ao talento e a curiosidade humana.

Pipa, fevereiro/2011

sexta-feira, 8 de abril de 2011

A PÉROLA RARA








Caros amigos e leitores,

Nesse último domingo na praia da Pipa, tomava um caldinho de “sururu” acompanhado de uma boa cachaça, quando mordi algo estranho que a princípio me pareceu uma pedra. Qual foi minha surpresa quando descobri que a suposta pedra, era nada menos que uma pérola. A descoberta inusitada me inspirou escrever uma crônica que será publicada ainda esse mês.

Abraço a todos,
Ormuz Simonetti

quinta-feira, 7 de abril de 2011

C O N V I T E


























C O N V I T E


O INSTITUTO NORTE-RIOGRANDENSE DE GENEALOGIA – INRG tem a satisfação de CONVIDAR os seus associados e pessoas interessadas para assistirem a reunião-palestra, que será realizada com a participação especial do nosso Vice-Presidente JOÃO FELIPE DA TRINDADE, o qual abordará o tema: “Genealogia - fontes para se construir uma árvore genealógica”
DATA/HORÁRIO: dia 12 de abril, às 19,30 horas
LOCAL: Solar Bela Vista – Av. Câmara Cascudo (antiga Junqueira Aires) – Natal
Natal, 07 de abril de 2011

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI
Presidente

terça-feira, 5 de abril de 2011

GATOS E PASSARINHOS




GATOS E PASSARINHOS
Bartolomeu Correia de Melo

Rastejando, de mansinho,
o gato leva o silêncio
ao canto do passarinho.
Triste Versejo


Derna de bem pixote, gosto de passarinho. Isso devo à solta meninice nas várzeas e tabuleiros do Ceará-Mirim. Cresci vendo tiziu saltar toco, pêga imitar gavião e galo-de-campina mudar de cor. Embora bem traquejado em truques de passarinhagem, sabedor de visgos e arapucas, desaprecio bichinho engaiolado. Pois havia um tio poeta que, sem sermões ecochatos, apenasmente nos punha a reconhecer e arremedar o canto de cada qual. E estrada afora, no verde-azul das manhãs, a gente menino seguia gozando o desafio.

- Tiu-tiriu-tiu! – canário-da-terra.

- Phru-phruphru! – rolinha cabocla.

- Fit-fit-fit-firiririri… – nhambu pé-roxo.

- Ih, passou a vez! Esse é o nhambu pedrês!

Depois veio desmatamento, cana-de-arisco, agrotóxico, espingarda-de-cartucho; tudo detrás de egoísmo e descaso, debaixo de ganância e ignorância… Mas, quem sabe, talvez por saudade, por insensato amor aos cantares da infância, alguns ainda prendam passarinhos como fossem lembranças engaioladas?

Nos meus tempos de mestre-de-academia, abrandava os rigores da físico-química nas cores de pau-d’arco e sons de bem-ti-vi que brotavam dos morros nos aceiros do campus universitário. Tinha sempre um sabiá cantando o fim do expediente e aquele casalzinho de rouxinóis que sempre se aninhava entre os frascos do laboratório. Pois que os pássaros fugidos das gaiolas urbanas, do Morro Branco ao Mirassol, foram se achegando e se arranchando nas árvores baldias e beirais de concreto.

E se misturavam à parolice dos estudantes, pondo música na decoreba das leis e doçura na demonstração dos teoremas. Eram sanhaçus, anuns-brancos, bicos-de-lacre, sebites, rolinhas pé-de-anjo… Até aparecia cancão e concriz. No mais disso, os quantos pardais, naquela importuna alegria de meninos-de-rua. Mas, num passar de pouco tempo, agora o campus quase emudece. Inda bem que, já aposentado, não mais testemunho o crescer de tal vazio.

No bem cedinho do todo-dia, passeio no antigo “bosque dos namorados”, com minha mulher e outras gentes dos meus bons tempos e sentimentos. Alguém caçoa da minha vagareza, enquanto gracejo com outro, ainda ligeiro feito moleque, correndo pra lugar nenhum. Mas, afora os ditos de camaradagem, gosto mesmo de escutar os passarinhos. Nisso sim, rebusco a infância sadia e a chegança da idade menos me dói.

Porém, meio amofinado, percebo que, as aves que ali gorjeiam já não cantam como antes. No invés disso, aqui-acolá, sem-vergonheira de gatos rasga um quase silêncio embrenhado nos restos de mata atlântica. Quede a passarada?

Mais por respeito ao carisma felino que mesmo por benquerença, sem arriscar muito achego, também aprecio gatos. Neles até gavo a auto-estima, a vaga magia, a falsa lerdeza, o feitio sensual, o jeito caviloso tão diverso dos passarinhos. Coisa sentida como assim descrita num hai-kai: “debaixo da mesa posta, o gato se lambe, porque se gosta.”

Por outras valias, há quem tenha, de-mesmo, amor aos bichanos, com todo apego e acarinho que minhas crenças e alergias não toleram. Além do que, de pessoas e de bichos, gosto do franco gostar; do bem-querer com resposta, mas sem barganha. Singeleza bonita, assim dada de graça, somente passarinho espalha. Gato é bicho enganoso; se basta caçador, descarece dum amo provedor. Mas, por esperto comodismo, roçando e ronronando, finge carinhosa servidão.

E nisso desfruta da nossa generosa pieguice. Bem reparando, caso haja caça, gatos dispensam qualquer proteção. Isso, tirante os filhotinhos ao desamparo, arrepiados e remiantes, parecendo feitos pra tocar corações… Pois justamente esses pobres bichinhos findam virando autores do triste sumiço da fauna miúda das dunas natalenses.

Filhotes de gato – predador eficiente como poucos – são abandonados por maldade dalguns e alimentados por piedade doutros, nas nobres áreas verdes da cidade do Natal. Eis aí a questão. Pois que, mesmo em penosa condição, felinos procriam muito rápido (até quinze filhotes ao ano), nisso podendo retornar ao estado semi-selvagem. Com instintos bem preservados, dotados de bons meios de defesa e quase sem inimigos naturais, facilmente sobrevivem, bordejando matas e tabuleiros, a devorar pássaros, répteis e roedores silvestres.

Tal fenômeno de desequilíbrio ecológico, envolvendo gatos antes domésticos, hoje ocorre intensamente na Austrália, com grande prejuízo da fauna de pequeno porte, já com algumas dezenas de espécies nativas postas em extinção. Isso, sem falar na toxoplasmose, doença insidiosa e traiçoeira, transmitida principalmente pelos gatos vadios.

No Parque das Dunas, nossa maior reserva florestal urbana, apesar da vizinhança do IBAMA e da Polícia Florestal, e no vizinho campus universitário (UFRN), nas barbas de ecologistas e biólogos, esse grave engano teima por demais acontecer. E, pelos meus muitos vistos e ouvidos, bem duvido que algo mude, por mais que se choramingue ou se esbraveje! Apesar dos pesares, denuncio; pra que, ao menos, conste a denúncia.

Com perdão dos salvadores de filhotes dos gatos-de-rua com tão troncha solução e perante tal descaso a semelhante desastre – passarinhos vira-virando saudades – desentalo minha revolta, mesmo perigando ser chamado de chato empedernido ou de poeta indevido.

Natal, novembro/2008

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A LEI - LIMA BARRETO

Na edição do dia 7 de janeiro de 1915 o Diário da Noite circulou nas ruas do Rio de Janeiro,
na coluna Vida Urbana, do escritor Lima Barreto, com sua crônica 'A Lei'. Há 96 anos, portanto, era dele o espanto diante da eficiência de certas leis, a ponto de perguntar, fechando o texto: 'De que vale a lei? É a mesma indagação que os brasileiros jazem diante da decisão do Supremo Tribunal Federal com o voto do desempate que livrou o ficha suja de perder seu mandato
. Quase um século depois, a pergunta do genial Lima Barreto se mantém viva: De que vale a lei?

A Lei

LIMA BARRETO


Este caso da parteira merece sérias reflexões que tendem a interrogar sobre a serventia da lei.
Uma senhora, separada do marido, muito naturalmente quer conservar em sua companhia a filha; e muito naturalmente também ¬não quer viver isolada e cede, por isto ou aquilo, a uma in¬clinação amorosa.

O caso se complica com uma gravidez e para que a lei, base¬ada em uma moral que já se findou, não lhe tire a filha, procurou ¬uma conhecida, sua amiga, a fim de provocar um aborto de forma a não se comprometer.

Vê-se bem que na intromissão da "curiosa" não houve nenhum¬a espécie de interesse subalterno, não foi questão de dinheiro. O que houve foi simplesmente camaradagem, amizade, vontade e servir a uma amiga, de livrá-la de uma terrível situação.
Aos olhos de todos, é um ato digno, porque, mais do que o amor, a amizade se impõe.

Acontece que a sua intervenção foi desastrosa e lá vem a lei, os regulamentos, a polícia, os inquéritos, os peritos, a faculdade e berram: você é uma criminosa! você quis impedir que nascesse mais um homem para aborrecer-se com a vida!
Berram e levam a pobre mulher para os autos, para a justiça, para a chicana, para os depoimentos, para essa via -sacra da justiça, que talvez o próprio Cristo não percorres¬se com resignação.

A parteira, mulher humilde, temerosa das leis, que não conhecia, amedrontada com a prisão, onde nunca espera¬va parar, mata-se.
Reflitamos, agora; não é estúpida a lei que, para prote¬ger uma vida provável, sacrifica duas? Sim, duas porque, outra procurou a morte para que a lei não lhe tirasse a filha. De que vale a lei?

(Transcrito da coluna CENA URBANA de Vicente Serejo)