Ormuz, fico contente em receber as crônicas sobre a praia de Pipa. Trazem muitas recordações, apesar de ser Recifense, tenho laços familiares em Goianinha, tio Alfredo e tia Waldira e meus primos, Amélia Judith, Rosário, Eliane, João Bosco, Clóvis , Alfredinho e Duartinho. Passei algumas férias e tive a oportunidade de veranear com eles em Pipa. Tenho excelentes recordações, da praia, do passeio sobre o morro, da chegada dos barcos com os peixes ainda vivos, do curral, dos bates papos noturnos (já que não existia televisão) na beira da praia, do forrozeiro contratado para tocar algumas horas e podermos nos divertir, etc.
Muito obrigada, um abraço,
Norma Carvalho
Recife - Pe
domingo, 6 de dezembro de 2009
A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS
ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG e membro do IHGRN) www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br
Publicada em “O JORNAL DE HOJE”, edição do dia 04.12.2009
PIPA, saudosos veranistas – Paulo Barbalho
Outro veranista que deixou muita saudade foi Paulo Barbalho. Seu veraneio começou ainda muito jovem acompanhando seus pais nas difíceis viagens entre Goianinha e a praia da Pipa. Seis anos depois do primeiro veraneio da praia, ocorrido em 1926, no dia 11 de março de 1932, nascia o menino Paulo. Foi o último dos onze filhos de Odilon Ernestino Barbalho e Elvira Macionila Barbalho. Criança irrequieta, sempre estava aprontando alguma traquinagem naquela Pipa dos anos 30 e 40.
A casa de seus pais ficava bem em frente a “Pedra do Santo”. Tinha um quintal muito grande com diversas mangueiras, coqueiros e um enorme pé de fruta pão. Nesse quintal em baixo das árvores, seu pai costumava manter durante o veraneio, uma boa vaca leiteira que trazia de sua fazenda em Goianinha. Pela manhã, lá estavam todos os irmãos em fila indiana, esperando a vez de tomar um caneco de leite quentinho ao pé da vaca, adoçado com açúcar mascavo do engenho Bem Fica. Esse hábito de manter uma vaca no quintal para tomar leite pela manhã, foi religiosamente seguido por tio Paulo, durante todos os anos que veraneou na Pipa.
No fim dos anos 60, por falta de proteção adequada, o mar foi derrubando, aos poucos, aquele casarão que tanta lembrança trazia a toda família, principalmente aos sobrinhos que nos meses de janeiro, lotavam aqueles alpendres. Foi uma morte lenta e sofrida por todos nós que adorávamos aquele casarão. Num ano vimos desmoronar, pela força das ondas, o quebra-mar juntamente com o alpendre. Quando retornamos no ano seguinte, toda a sala da frente e uma parte da lateral da casa estavam no chão. A sua heróica resistência devia-se ao fato de ser uma construção feita em taipa e com madeira de boa qualidade. Os esteios, vigas, travessões e inchamés, enfim todo o madeiramento da casa foi feitos com pau-ferro e outras madeiras de lei, extraídas das matas da Pipa, abundante naquele tempo.
Guardei muitas lembranças desse velho casarão. Quando meus pais ainda não tinham casa na Pipa, veraneamos algumas vezes na casa dos meus avós. Guardo até hoje, algumas lembranças dos meus sete a oito anos de idade. Tinha por costume acordar muito cedo e depois de retirar, com todo o cuidado para não acordar meus pais, a pesada trave de sucupira, abria um pouco da janela e ficava admirando os botes ancorados no porto. Logo começava a procurar ao longo do horizonte aqueles pontinhos branco. Era a vela dos barcos que retornavam das pescarias de “dormida”. No porto, outros permaneciam ancorados naquele indolente balançar. Ficava impressionado com os pescadores, que em suas conversas no porto, diziam a quem pertencia o barco que estava chegando, somente pelo formato da vela. Sempre que me lembro da Pipa é a primeira visão que me vem: o raiar do dia com os botes ancorados no porto.
Pois bem, foi nesse casarão que por volta do ano de 1974, ocorreu um fato que me marcou de maneira jocosa a história dos veraneios na Pipa. A casa estava sendo preparada para o veraneio e “tia” Júlia, sua esposa, havia enviado na frente os empregados juntamente com a bagagem. A recomendação era de fazer uma rigorosa limpeza, já que a casa permanecia o ano inteiro fechada. Depois de deixar tudo bem limpo e devidamente arrumado, os empregados retornaram para Goianinha. A família deveria chegar três dias depois. Aconteceu que minha mãe, e sua irmã, preocupada com a dormida nos alpendres dos filhos e sobrinhos, teve a infeliz idéia de ficar com as chaves da casa, para que lá nós dormíssemos, enquanto a família não chegasse. A turma, que sempre arranjava um motivo pra farrear, já havia acertado para aquela noite, uma movimentada serenata.
Como a dormida garantida em local seguro, não haveria preocupação com as brincadeiras de dar nó nos punhos das redes e outras coisas do gênero. Logo cedo, após o jantar, as redes foram devidamente armadas. Quem chegava primeiro, escolhia os melhores cômodos em seguida a casa foi devidamente trancada. Lá pela madrugada, com a serenata terminada e as redes todas ocupadas, o piso dos quartos e salas começam a receber as primeiras reações estomacais dos que beberam além da conta, e principalmente abusaram da sardinha “Coqueiro” e da carne de quitute “Da Vaquinha”, acompanhado de farinha grossa (única disponíveis nas bodegas), tira-gostos preferidos naquelas madrugadas dos anos 70.
O cheiro de azedo já tomava conta do ambiente quando começou a “guerra”. Alguém atirou um pinico (urinol) por cima da meia parede e em seguida, de cada cômodo ocupado partia, via aéreo, tamboretes, cadeiras, bacias de lavar rosto juntamente com o jarro e tripé, outros pinicos da ágata (faziam um barulho enorme quando batiam no chão) panelas, adornos de cima das mesas e tudo que estivesse ao alcance das mãos. A batalha varou a madrugada.
Pela manhã, quando todos nós dormíamos a sono solto, aconteceu o que ninguém esperava. Por volta das 9hrs alguém escutou um barulho no quintal e foi verificar. Era a carro de tio Paulo que chegava com a família, antecipando em dois dias sua chegada. Foi uma correria danado. Janelas e portas se abriram ao tempo que pulava gente pra todo lado menos, naturalmente, para o quintal. Não preciso dizer à surpresa que ele teve quando adentrou a casa. Entre gritos coléricos e alguns palavrões, ordenou que os empregados fossem de quarto em quarto e recolhessem todas as redes. Feito isso, amontoou-as no quintal e mandou comprar, pelo seu compadre e vizinho Zé de Tereza, um litro de querosene, na bodega mais próxima. Depois de alguns apelos de Júlia e a proposital demora na execução de sua ordem na compra do combustível, ele se acalmou e desistiu da fogueira. Mas não deixou por menos, mandou entregar as redes na casa de cada mãe com o relato detalhado do acontecido.
Tenho a impressão que depois de calmo ele deve ter dado boas risadas lembrando-se do seu tempo de estudante na década de 50, quando morava em Maceió. Numa dessas brincadeiras extravagante que ele tanto gostava, atirou do terceiro andar do Hotel Bela Vista, do turco Adib, localizado na Rua do Comércio, um guarda roupas, que se espatifou no meio da avenida. Wodem Madruga conhece bem essa história, pois na época era hóspede desse mesmo hotel.
Tio Paulo era assim, adorava esse tipo de brincadeiras. Muito explosivo, entretanto nunca guardava rancor. Logo, já havia esquecido tudo. Dois dias depois, com os devidos “relas”, todos nós já estávamos perdoados e em seu alpendre desfrutava daquela maravilhosa acolhida, sua marca registrada. Gostava e sabia receber como ninguém. Foi o maior anfitrião que conheci.
Anos depois em 1988, voltou a veranear na Pipa. A nova casa ficava na confluência de duas ruas no Largo de São Sebastião, bem ao lado da igreja. Estrategicamente, não tinha muros na frente da casa. Ali, quem passava era convidado para entrar e bater um papo no alpendre pintado de verde. Era apaixonado pela cor símbolo das campanhas políticas na década de 60 do amigo Aluízio Alves. Em cima de uma mesa, também verde, nunca deixava de ter um bom sarapatel, buchada e carneiro guisado, trazidos de Lagoa Nova, fazenda de sua paixão. Essa mesa também era repleta das mais variadas bebidas e muitas frutas que se destinavam ao tira-gosto de sua bebida preferida: a aguardente, também conhecida como cachaça, pinga, branquinha, birita, malvada, água que passarinho não bebe, esquenta goela etc.
Gostava de beber deitado em sua rede verde, balançando preguiçosamente no alpendre e entre um gole e outro, relatava estórias engraçadas dos nossos antepassados, sempre rodeado de sobrinhos e amigos. Recordo com saudade daquele seu brado característico. Bastava achar que a mesa não estava devidamente repleta dos mais diversos tira-gostos, não tinha dúvidas, gritava com todas as forças: JUUUUUUUUUUUUUUULIAAA!!!
Publicada em “O JORNAL DE HOJE”, edição do dia 04.12.2009
PIPA, saudosos veranistas – Paulo Barbalho
Outro veranista que deixou muita saudade foi Paulo Barbalho. Seu veraneio começou ainda muito jovem acompanhando seus pais nas difíceis viagens entre Goianinha e a praia da Pipa. Seis anos depois do primeiro veraneio da praia, ocorrido em 1926, no dia 11 de março de 1932, nascia o menino Paulo. Foi o último dos onze filhos de Odilon Ernestino Barbalho e Elvira Macionila Barbalho. Criança irrequieta, sempre estava aprontando alguma traquinagem naquela Pipa dos anos 30 e 40.
A casa de seus pais ficava bem em frente a “Pedra do Santo”. Tinha um quintal muito grande com diversas mangueiras, coqueiros e um enorme pé de fruta pão. Nesse quintal em baixo das árvores, seu pai costumava manter durante o veraneio, uma boa vaca leiteira que trazia de sua fazenda em Goianinha. Pela manhã, lá estavam todos os irmãos em fila indiana, esperando a vez de tomar um caneco de leite quentinho ao pé da vaca, adoçado com açúcar mascavo do engenho Bem Fica. Esse hábito de manter uma vaca no quintal para tomar leite pela manhã, foi religiosamente seguido por tio Paulo, durante todos os anos que veraneou na Pipa.
No fim dos anos 60, por falta de proteção adequada, o mar foi derrubando, aos poucos, aquele casarão que tanta lembrança trazia a toda família, principalmente aos sobrinhos que nos meses de janeiro, lotavam aqueles alpendres. Foi uma morte lenta e sofrida por todos nós que adorávamos aquele casarão. Num ano vimos desmoronar, pela força das ondas, o quebra-mar juntamente com o alpendre. Quando retornamos no ano seguinte, toda a sala da frente e uma parte da lateral da casa estavam no chão. A sua heróica resistência devia-se ao fato de ser uma construção feita em taipa e com madeira de boa qualidade. Os esteios, vigas, travessões e inchamés, enfim todo o madeiramento da casa foi feitos com pau-ferro e outras madeiras de lei, extraídas das matas da Pipa, abundante naquele tempo.
Guardei muitas lembranças desse velho casarão. Quando meus pais ainda não tinham casa na Pipa, veraneamos algumas vezes na casa dos meus avós. Guardo até hoje, algumas lembranças dos meus sete a oito anos de idade. Tinha por costume acordar muito cedo e depois de retirar, com todo o cuidado para não acordar meus pais, a pesada trave de sucupira, abria um pouco da janela e ficava admirando os botes ancorados no porto. Logo começava a procurar ao longo do horizonte aqueles pontinhos branco. Era a vela dos barcos que retornavam das pescarias de “dormida”. No porto, outros permaneciam ancorados naquele indolente balançar. Ficava impressionado com os pescadores, que em suas conversas no porto, diziam a quem pertencia o barco que estava chegando, somente pelo formato da vela. Sempre que me lembro da Pipa é a primeira visão que me vem: o raiar do dia com os botes ancorados no porto.
Pois bem, foi nesse casarão que por volta do ano de 1974, ocorreu um fato que me marcou de maneira jocosa a história dos veraneios na Pipa. A casa estava sendo preparada para o veraneio e “tia” Júlia, sua esposa, havia enviado na frente os empregados juntamente com a bagagem. A recomendação era de fazer uma rigorosa limpeza, já que a casa permanecia o ano inteiro fechada. Depois de deixar tudo bem limpo e devidamente arrumado, os empregados retornaram para Goianinha. A família deveria chegar três dias depois. Aconteceu que minha mãe, e sua irmã, preocupada com a dormida nos alpendres dos filhos e sobrinhos, teve a infeliz idéia de ficar com as chaves da casa, para que lá nós dormíssemos, enquanto a família não chegasse. A turma, que sempre arranjava um motivo pra farrear, já havia acertado para aquela noite, uma movimentada serenata.
Como a dormida garantida em local seguro, não haveria preocupação com as brincadeiras de dar nó nos punhos das redes e outras coisas do gênero. Logo cedo, após o jantar, as redes foram devidamente armadas. Quem chegava primeiro, escolhia os melhores cômodos em seguida a casa foi devidamente trancada. Lá pela madrugada, com a serenata terminada e as redes todas ocupadas, o piso dos quartos e salas começam a receber as primeiras reações estomacais dos que beberam além da conta, e principalmente abusaram da sardinha “Coqueiro” e da carne de quitute “Da Vaquinha”, acompanhado de farinha grossa (única disponíveis nas bodegas), tira-gostos preferidos naquelas madrugadas dos anos 70.
O cheiro de azedo já tomava conta do ambiente quando começou a “guerra”. Alguém atirou um pinico (urinol) por cima da meia parede e em seguida, de cada cômodo ocupado partia, via aéreo, tamboretes, cadeiras, bacias de lavar rosto juntamente com o jarro e tripé, outros pinicos da ágata (faziam um barulho enorme quando batiam no chão) panelas, adornos de cima das mesas e tudo que estivesse ao alcance das mãos. A batalha varou a madrugada.
Pela manhã, quando todos nós dormíamos a sono solto, aconteceu o que ninguém esperava. Por volta das 9hrs alguém escutou um barulho no quintal e foi verificar. Era a carro de tio Paulo que chegava com a família, antecipando em dois dias sua chegada. Foi uma correria danado. Janelas e portas se abriram ao tempo que pulava gente pra todo lado menos, naturalmente, para o quintal. Não preciso dizer à surpresa que ele teve quando adentrou a casa. Entre gritos coléricos e alguns palavrões, ordenou que os empregados fossem de quarto em quarto e recolhessem todas as redes. Feito isso, amontoou-as no quintal e mandou comprar, pelo seu compadre e vizinho Zé de Tereza, um litro de querosene, na bodega mais próxima. Depois de alguns apelos de Júlia e a proposital demora na execução de sua ordem na compra do combustível, ele se acalmou e desistiu da fogueira. Mas não deixou por menos, mandou entregar as redes na casa de cada mãe com o relato detalhado do acontecido.
Tenho a impressão que depois de calmo ele deve ter dado boas risadas lembrando-se do seu tempo de estudante na década de 50, quando morava em Maceió. Numa dessas brincadeiras extravagante que ele tanto gostava, atirou do terceiro andar do Hotel Bela Vista, do turco Adib, localizado na Rua do Comércio, um guarda roupas, que se espatifou no meio da avenida. Wodem Madruga conhece bem essa história, pois na época era hóspede desse mesmo hotel.
Tio Paulo era assim, adorava esse tipo de brincadeiras. Muito explosivo, entretanto nunca guardava rancor. Logo, já havia esquecido tudo. Dois dias depois, com os devidos “relas”, todos nós já estávamos perdoados e em seu alpendre desfrutava daquela maravilhosa acolhida, sua marca registrada. Gostava e sabia receber como ninguém. Foi o maior anfitrião que conheci.
Anos depois em 1988, voltou a veranear na Pipa. A nova casa ficava na confluência de duas ruas no Largo de São Sebastião, bem ao lado da igreja. Estrategicamente, não tinha muros na frente da casa. Ali, quem passava era convidado para entrar e bater um papo no alpendre pintado de verde. Era apaixonado pela cor símbolo das campanhas políticas na década de 60 do amigo Aluízio Alves. Em cima de uma mesa, também verde, nunca deixava de ter um bom sarapatel, buchada e carneiro guisado, trazidos de Lagoa Nova, fazenda de sua paixão. Essa mesa também era repleta das mais variadas bebidas e muitas frutas que se destinavam ao tira-gosto de sua bebida preferida: a aguardente, também conhecida como cachaça, pinga, branquinha, birita, malvada, água que passarinho não bebe, esquenta goela etc.
Gostava de beber deitado em sua rede verde, balançando preguiçosamente no alpendre e entre um gole e outro, relatava estórias engraçadas dos nossos antepassados, sempre rodeado de sobrinhos e amigos. Recordo com saudade daquele seu brado característico. Bastava achar que a mesa não estava devidamente repleta dos mais diversos tira-gostos, não tinha dúvidas, gritava com todas as forças: JUUUUUUUUUUUUUUULIAAA!!!
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