ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Genealogista e historiador)
PIPA, saudosas lembranças
Tenho saudade dos veraneios das décadas de 70 e 80. Vez por outra, me pego em saudoso devaneio lembrando aquela época. Isso ocorre principalmente quando vejo a praia sendo tão maltratada por aqueles que teriam a responsabilidade de cuidar. As falésias, invadidas pelas pousadas, estão pontilhadas de cano de esgoto, propiciando aos que por ali passam uma triste visão e a sensação de que estamos perdendo a guerra contra esse tipo de pessoas. Em alguns pontos, os canos são bem visíveis. Indicam que ali não se tem nenhum respeito pela natureza nem com o próprio lugar onde vive com a família.
Quando vejo aquele pequeno pedaço de praia, que com certeza é a menor do Brasil, sem espaço para os banhistas, apinhada de sombrinhas e de vendedores, causa-me um extremo desconforto. É um verdadeiro mercado persa, onde se vende todo tipo de mercadorias, desde alimentos de duvidosa higiene a roupas, artesanatos e, ultimamente, mais uma modalidade de exploração comercial: o aluguel de cadeiras e sombrinhas. A desorganização é total. Não existem regras para nada, ou pelo menos não as percebemos. As sombrinhas de praia tomam conta de toda a pequena orla. Os comerciantes do local, no afã de ganhar mais dinheiro, invadem o pequeno espaço que os banhistas têm para se locomover, chegando ao ponto de colocarem as sombrinhas até dentro d’água, acompanhando a vazante da maré. E tudo isso sob os olhos complacentes do poder público, que nada faz para modificar essa situação.
Tenho saudade sim, daqueles veraneios de outrora, quando podíamos andar pela praia sem ter que se deparar com esse tipo de situação. Não quero com isso dizer que sou contra o progresso, principalmente aquele que traz benefícios à população. Todavia sou terminantemente contra o progresso a qualquer custo. Aquele que é feito sem o mínimo planejamento, desorganizado, poluidor e destruidor, que passa por cima de tudo e de todos, contanto que atinjam seus objetivos mercantilistas. De uns tempos prá cá, o lema na Pipa constitui-se em: dinheiro e lucro a qualquer custo!
Tenho saudade de quando andava pela praia pisando na areia branca que, de tão alvas e macias, dava vontade de se deitar. Ainda posso ouvir o rangido fino que elas produziam quando pisávamos com mais força ou então quando corríamos sobre elas. Quantas vezes, depois de uma noite de “serenatas”, ficávamos a conversar naquelas areias até alta madrugada... Por vezes, dormíamos ali mesmo. Não tínhamos medo, pois não havia motivo para tal. Até o final da década de 80 não me lembro ter acontecido na Pipa, nenhum fato que envolvesse violência. Era comum as pessoas dormirem em suas casas com as janelas abertas, sem nenhum receio. E como era bonito acordar bem cedinho e olhar os botes ancorados no porto, naquele seu indolente balançar.
Quando os primeiros raios do sol surgiam por cima do morro do “cruzeiro”, revelavam toda a exuberância de um pedaçinho da mata atlântica, naquele tempo, totalmente preservada. Infelizmente não posso dizer o mesmo nos dias de hoje. Basta dar uma olhada à noite pra ver o foco das luzes dentro da mata que cobre o morro, para que se percebam as construções que lá existem. Irregulares? . . . Não sei!
Quantas vezes eu amanheci naquelas areias contemplando a imensidão do oceano iluminado pelos primeiros raios do sol... Logo era invadido por uma profunda paz de espírito, como sentindo a presença Divina. A contemplação da natureza em todas as suas formas nos propicia esse estado de paz e bonança com o Criador.
Sim, tenho muita saudade das noites dormidas nos alpendres. Das brincadeiras de dar “nó de jabá” no punho das redes dos mais descuidados ou dos incautos “visitantes”. Os namorados das nossas primas eram os nossos principais alvos. Alguns dos rapazes mais afoitos além de dar o famigerado nó, colocavam a rede de volta nos armadores e com o peso de seu corpo arrochava o máximo que pudesse. Depois, ainda urinava em cima para que o infeliz não pudesse usar os dentes para desatá-lo. Que maldade! O coitado tinha que se arrumar lá pelas areias da praia, e certamente amanhecia o dia sem pregar olhos.
Essa era a Pipa dos anos dourados. Ocorreu-me agora a lembrança dos versos de uma música do poeta Dorival Caymmi, eterno apaixonado por sua terra. Diz muito da Pipa daquela época, do tempo da beleza, talvez do tempo da delicadeza.
“. . . É quando o sol vai quebrando, lá pra o fim do mundo pra a noite chegar
É quando se ouve mais forte, o ronco das ondas na beira do mar
É quando a cansaço da vida, da lida obriga João se sentar
É quando a morena se enrosca se chega pro lado querendo agradar
Se a noite é de lua a vontade é contar mentiras é se espreguiçar
Deitar na areia da praia que acaba onde a vista não pode alcançar
E assim adormece esse homem que nunca precisa dormir pra sonhar
Porque não há sonho mais lindo do que sua terra, não há.”
PIPA, saudosas lembranças
Tenho saudade dos veraneios das décadas de 70 e 80. Vez por outra, me pego em saudoso devaneio lembrando aquela época. Isso ocorre principalmente quando vejo a praia sendo tão maltratada por aqueles que teriam a responsabilidade de cuidar. As falésias, invadidas pelas pousadas, estão pontilhadas de cano de esgoto, propiciando aos que por ali passam uma triste visão e a sensação de que estamos perdendo a guerra contra esse tipo de pessoas. Em alguns pontos, os canos são bem visíveis. Indicam que ali não se tem nenhum respeito pela natureza nem com o próprio lugar onde vive com a família.
Quando vejo aquele pequeno pedaço de praia, que com certeza é a menor do Brasil, sem espaço para os banhistas, apinhada de sombrinhas e de vendedores, causa-me um extremo desconforto. É um verdadeiro mercado persa, onde se vende todo tipo de mercadorias, desde alimentos de duvidosa higiene a roupas, artesanatos e, ultimamente, mais uma modalidade de exploração comercial: o aluguel de cadeiras e sombrinhas. A desorganização é total. Não existem regras para nada, ou pelo menos não as percebemos. As sombrinhas de praia tomam conta de toda a pequena orla. Os comerciantes do local, no afã de ganhar mais dinheiro, invadem o pequeno espaço que os banhistas têm para se locomover, chegando ao ponto de colocarem as sombrinhas até dentro d’água, acompanhando a vazante da maré. E tudo isso sob os olhos complacentes do poder público, que nada faz para modificar essa situação.
Tenho saudade sim, daqueles veraneios de outrora, quando podíamos andar pela praia sem ter que se deparar com esse tipo de situação. Não quero com isso dizer que sou contra o progresso, principalmente aquele que traz benefícios à população. Todavia sou terminantemente contra o progresso a qualquer custo. Aquele que é feito sem o mínimo planejamento, desorganizado, poluidor e destruidor, que passa por cima de tudo e de todos, contanto que atinjam seus objetivos mercantilistas. De uns tempos prá cá, o lema na Pipa constitui-se em: dinheiro e lucro a qualquer custo!
Tenho saudade de quando andava pela praia pisando na areia branca que, de tão alvas e macias, dava vontade de se deitar. Ainda posso ouvir o rangido fino que elas produziam quando pisávamos com mais força ou então quando corríamos sobre elas. Quantas vezes, depois de uma noite de “serenatas”, ficávamos a conversar naquelas areias até alta madrugada... Por vezes, dormíamos ali mesmo. Não tínhamos medo, pois não havia motivo para tal. Até o final da década de 80 não me lembro ter acontecido na Pipa, nenhum fato que envolvesse violência. Era comum as pessoas dormirem em suas casas com as janelas abertas, sem nenhum receio. E como era bonito acordar bem cedinho e olhar os botes ancorados no porto, naquele seu indolente balançar.
Quando os primeiros raios do sol surgiam por cima do morro do “cruzeiro”, revelavam toda a exuberância de um pedaçinho da mata atlântica, naquele tempo, totalmente preservada. Infelizmente não posso dizer o mesmo nos dias de hoje. Basta dar uma olhada à noite pra ver o foco das luzes dentro da mata que cobre o morro, para que se percebam as construções que lá existem. Irregulares? . . . Não sei!
Quantas vezes eu amanheci naquelas areias contemplando a imensidão do oceano iluminado pelos primeiros raios do sol... Logo era invadido por uma profunda paz de espírito, como sentindo a presença Divina. A contemplação da natureza em todas as suas formas nos propicia esse estado de paz e bonança com o Criador.
Sim, tenho muita saudade das noites dormidas nos alpendres. Das brincadeiras de dar “nó de jabá” no punho das redes dos mais descuidados ou dos incautos “visitantes”. Os namorados das nossas primas eram os nossos principais alvos. Alguns dos rapazes mais afoitos além de dar o famigerado nó, colocavam a rede de volta nos armadores e com o peso de seu corpo arrochava o máximo que pudesse. Depois, ainda urinava em cima para que o infeliz não pudesse usar os dentes para desatá-lo. Que maldade! O coitado tinha que se arrumar lá pelas areias da praia, e certamente amanhecia o dia sem pregar olhos.
Essa era a Pipa dos anos dourados. Ocorreu-me agora a lembrança dos versos de uma música do poeta Dorival Caymmi, eterno apaixonado por sua terra. Diz muito da Pipa daquela época, do tempo da beleza, talvez do tempo da delicadeza.
“. . . É quando o sol vai quebrando, lá pra o fim do mundo pra a noite chegar
É quando se ouve mais forte, o ronco das ondas na beira do mar
É quando a cansaço da vida, da lida obriga João se sentar
É quando a morena se enrosca se chega pro lado querendo agradar
Se a noite é de lua a vontade é contar mentiras é se espreguiçar
Deitar na areia da praia que acaba onde a vista não pode alcançar
E assim adormece esse homem que nunca precisa dormir pra sonhar
Porque não há sonho mais lindo do que sua terra, não há.”