terça-feira, 5 de janeiro de 2010

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

Ormuz,


É uma pena que o tal do "desenvolvimento" traga com o seu crescimento a destruição das belas paisagens, das tradições culturais e até mesmo do
maravilhoso sossêgo que as coisas de antigamente propiciavam.
O capitalismo mal conduzido é destruidor, é criador de outras formas de ver a vida, distorcendo valores e, muitas vezes, querendo valorizar o vazio. Mas,
precisamos nos acostumar e conviver com o atual, construindo nossas crenças e tentando salvar aquilo que ainda é possível.

Carlos Cabral
Natal-RN

domingo, 3 de janeiro de 2010

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

Querido amigo, gostei muito desta crônica. Precisamos de pessoas como você, capaz de dizer a verdade sem importar em agradar pessoas, empresas ou instituições.

Socorro Cabral
Natal-RN

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG e membro do IHGRN) www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br

PUBLICADA EM “O JORNAL DE HOJE” EDIÇÃO DE 02.01.2010


PIPA, PORQUE ESCREVO ESSAS CRÔNICAS

Tenho sido constantemente questionado a respeito das crônicas que escrevo sobre a Praia da Pipa. A pergunta mais freqüente é “por que?”. Outros perguntam se essas crônicas vão retratar a Pipa até os dias de hoje. A Pipa dos belos hotéis e pousadas, cosmopolita, apinhada de turistas de todas as partes do mundo, dos restaurantes de diversas nacionalidades com suas cozinhas típicas, de uma vida noturna em constante ebulição que só começa após as 22 horas e termina com os primeiros raios do sol.

A Pipa que tenho tentado retratar através das crônicas já publicadas e as que ainda serão refere-se principalmente à Pipa de antigamente. Essas crônicas não irão além dos anos 90, mesmo porque o meu propósito é fazer um registro da época em que a praia era somente uma colônia de pescadores onde algumas poucas famílias de Goianinha, passavam férias nos meses de janeiro. É da praia daquela época que costumo me referir como “à Pipa do tempo da delicadeza”.

Iniciei essas crônicas quase como um desafio, pois minha área preferida é a genealogia. Nunca havia me imaginado como escritor de crônicas. Certa vez, em conversa com o meu amigo, o escritor Valério Mesquita, sobre a praia da Pipa, lhe falava da minha preocupação quanto às matérias que, volta e meia, eram abordadas na imprensa escrita e televisiva. Sempre aparecia alguém falando bobagens ou relatando invencionices. Esses depoimentos geralmente eram dados por pessoas sem nenhum conhecimento da história e tradições do lugar. Indivíduos que, pelo simples fato de morar ou terem morado na Pipa, na maioria das vezes por um curto período, já se arvorava a ser um grande conhecedor da terra, da sua gente e de seus costumes.

Chegou-se ao ponto de modificar os nomes primitivos de algumas praias. Outras, por não serem muito freqüentadas pelos “turistas”, tiveram seus nomes totalmente esquecidos, e pasmem, até mesmo pela população nativa.

O “Morro dos amores” de belas tradições e histórias registradas na memória oral dos veranistas e nativos, transformou-se mais que de repente, em “Praia do amor”. A história dessa praia é além de bonita, um tanto pitoresca. Recebeu esse nome porque na década de 40 e 50, nossos ancestrais se aventuravam naqueles morros para desfrutar, junto com suas amadas, da tranqüilidade e da rara beleza daquele lugar. Declarações e juras apaixonadas ali foram trocadas por nossos pais e avós nos momento mais sublime de suas vidas. Dizem até que, alguns de nós, fomos gerados naquelas areias encantadas.
Hoje esses morros já não são mais os guardiões de segredos e estórias dos amantes e futuros amantes.

A poesia deu lugar à especulação e ao afã de alguns pelo lucro a qualquer custo. Degradados e agredidos das mais diversas formas, estão repletos de toscos barracos. Suas areias e falésias invadidas por bares de toda espécie, sem nenhum critério de ocupação, e alguns por mais absurdo que seja, foram construídos escavando as paredes das falésias. A pouca vegetação existente, vem sendo sistematicamente cortada para dar espaço a mais uma construção, das muitas que se multiplicam a uma velocidade impressionante, sem nenhum tipo de fiscalização.

A praia “Curral do Canto”, sempre foi cultuada pelos nativos e veranistas por sua beleza singular. A enseada rodeada por gigantescas falésias de cor avermelhada constitui visão maravilhosa ao tempo que transmite uma agradável sensação de paz interior, somente sentida por aqueles que por lá, já estiveram. Esse nome, que teve origem nos antigos currais de peixes que existiram até a década de 90, infelizmente foi transformado em “Baia dos Golfinhos”, menos tradicional e mais comercial.

Outras praias como Ponta do Pirambú, Cacimbinha, Madeirinho, Madeiro, Baixinha, Porto de baixo, Afogados, Cancelas, Pedra d’água e praia das Minas, não se falam mais, foram totalmente esquecidas por não estarem inseridas no roteiro turístico. Felizmente seus nomes ainda continuam preservados, porém esquecidos. Até quando? É verdade que na Praia do Curral do Canto a sua maior atração turística são os cetáceos peixes-boto, também conhecidos por toninhas ou golfinhos, que se exibem quando em perseguição às tainhas, que constituem seu principal alimento. Entretanto, não era necessário que se mudasse o tradicional nome da praia, para poder apreciá-los em seu habitat natural.

Mas os guias turísticos logo criaram um nome, mais atrativo, e porque não dizer, mais comercial. E assim, juntamente com os que chegam, vão modificando tanto os nomes primitivos como a sua própria geografia com os desmatamentos, construções irregulares, costumes e hábitos nem sempre saudáveis à população, e se não houver providências urgentes, só Deus sabe o que ainda será modificado.

E assim vão aos poucos, sorrateiros, transformando o que o um povo tem de mais importante: sua cultura e tradições. E o que preocupa é a aceitação passiva pelos nativos das gerações mais recentes, deslumbrados com o novo estilo de vida imposto pelos que chegam. Não quero com isso me colocar na contramão do desenvolvimento, apenas alertar para como esta sendo feito, pois considero a atual situação, no mínimo preocupante.

Pois bem, foi motivado por tudo isso que resolvi aceitar o desafio na tentativa de preservar a memória da Pipa e alertar as pessoas quanto à manutenção de suas raízes e tradições.Procurei dividi o que iria escrever de maneira que pudesse iniciar pelo estudo etnológico resgatando sua história desde que lá chegaram os franceses, atraídos pelo nosso Pau Brasil. Prossegui contando a saga dos primeiros veranistas que viajavam de Goianinha até a Pipa em charretes, cabriolés e carros de bois.

Procuro fazer um relato de suas histórias pitorescas durante os veraneios. Abri espaço pra fazer uma justa homenagem aos que já não se encontram entre nós com a série “saudosos veranistas”. Essas, porém são as mais difíceis de serem escritas, pois me remetem a um tempo que, junto com eles, participei da maioria das brincadeiras relatadas, e isso inevitavelmente, me traz uma enorme e dolorida saudade.

ACTAS DIURNAS - MANIFESTAÇÕES

Ormuz

Infelizmente não será possível, mas valeu a intenção. Novas idéias com certeza surgirão.

Cabral

ACTAS DIURNAS - MANIFESTAÇÕES

Não se aborreça com o fato, amigo. Voce está escrevendo a sua própria história e eles o fazem sem mostrar o brilho PESSOAL Precisam do mestre Cascudo para isso. É uma pena... enquanto isso, uma editora do sul publicou várias obras de Cascudo. Será que questionaram? Mas não impediram.....
Toque o seu blog com outras coisas.
Um grande abraço de Ano novo.
Conceição

ACTAS DIURNAS - MANIFESTAÇÕES

Ormuz:

General Castelo Branco dizia que:

... de bem intensionados estão cheios os cemitérios...

O nosso Estado está cheio de jornalistas com crônicas diárias esquecidas no tempo.

Deixe os herdeiros de Cascudinho cuidarem do seu patrimonio, não ache ruim.

Procure no seu entorno e vai achar pedras da mesma qualidade e de quilate maior, talvez.

O resgate dessas matérias está clamando por nossa ajuda.

Sugiro DANILO, Dr. Aderbal de França, só para começar.

E, no final de 2010 daremos a nossa resposta.

Sem mais comentários, feliz por me tornar blogueiro.

Viva Manoel Neto, viva Felipe, viva Anderson, viva Jesus de Miudo, viva o Teorema da Feira e todos os que comprovam que Natal está intelectuamente mais viva do que antes.

Aos seus e aos nossos, afetos genealógicos que estão no nosso DNA Potiguar.

Ouse sempre.
Edgar

ACTAS DIURNAS - MANIFESTAÇÕES

Amigo Ormuz:

Bom dia!

Cascudo é um diamante transformado em jóia e, como vê, tem dono.

É roteiro, é caminho e, muitas vezes, fonte.

Quando ele se foi Oswaldo Lamarine, acho, indagava - E agora à quem vamos perguntar
as coisas?

Estão ditas, todas, nos seus escritos, e Zila o dimensionou quase todo.

Tem os seus cultores e herdeiros.

Não é mais para ser o centro das nossas anotações, pesquisas, preocupações.

Temos coisas mais importantes para fazer.

Esta semana Felipe, no rastro de Cascudo, resgata José Borja, e Anderson o Professor

Caetano e Mário Tavares, veja só.

No mais, Paz e Saúde em 2010.

ACTAS DIURNAS - MANIFESTAÇÕES

Meu Caro Ormuz,
No período em que se dedicou a pesquisa, para tornar possível a publicação dos seus escritos genealógicos, sei que se apaixonou pela obra do mestre Câmara Cascudo. Colecionou seus livros, e tornou-se aprendiz de bibliófilo.
No ano de 1986, um dos jornais de Natal publicava a seguinte manchete: "Há uma vaga de gênio na cultura do RN". Uma manchete impactante para anunciar a morte de um gênio. Chorávamos com a partida de Câmara Cascudo.
Os legítimos representantes da cultura, como gostava de dizer meu professor, Berilo Wanderley, de saudosa memória da “tupiniquim até o sul maravilha”, já falaram - e ainda falarão - sobre o nosso grandioso Cascudo.
Quando jovem, e não faz muito tempo, li, nesse mesmo matutino, uma frase de abertura de um discurso de agradecimento de uma homenagem que recebera no Museu que hoje leva o seu nome. E iniciava assim: "Acabo de fazer uma transformação miraculosa no campo da fisiologia. Estou ouvindo com o coração porque a minha audição anoiteceu, e eu perdi a intimidade do som". É desnecessário lhe dizer o quanto somos iguais, quando o assunto é Cascudo. Por isso, peço-lhe que, ao invés de insistir em publicar seus textos em seu blog, vamos divulgá-lo com os registros que são do conhecimento público, e, portanto, distante das amarras. Se vivo fosse, seguramente, não estaria muito interessado nessas questões menores. A sua satisfação, e eu sei, é apenas divulgar os textos que, quando estamos (re)lendo, nos sentimos privilegiados de tê-lo conhecido, e orgulhosos em podermos dizer: Sou conterrâneo de Câmara Cascudo. O mais, é uma triste confirmação do lamento do Eclesiastes: nada há de novo debaixo do Sol...
Saudações Cascudianas
Arnilton

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

ACTAS DIURNAS

Caros amigos e leitores. É com profunda tristeza que comunico do meu declínio, na pretensão de divulgar nesse blog, a partir de 2010 com transcrição ipsis litteris, as ACTAS DIURNAS do nosso mestre maior, Luiz da Câmara Cascudo. Agradeço aos que se manifestaram através de e-mails pela iniciativa e aproveito para pedir desculpa pela possibilidade de ter criado expectativas a esse respeito.

Segue, abaixo, o e-mail recebido, motivo da desistência.
Abraço a todos,

Prezado Ormuz:

Acabei de ver no seu blog a notícia de que, a partir de 2010, você estará publicando no mesmo as ACTAS DIURNAS de autoria do meu avô.
Gostaria de informá-lo que esta publicação no blog NÃO pode ser possível, pelos seguintes motivos:
1) Já existe o BLOG DO CASCUDO, onde as mesmas Actas Diurnas são publicadas,semanalmente. Nos últimos tempos, passamos por problemas de atualização que estão sendo resolvidos.
2) Estamos abrindo o INSTITUTO CÂMARA CASCUDO e fazendo um site, onde todo este material será contemplado.

3) A obra do meu avô possui direitos autorais até o ano de 2057, e qualquer publicação só pode ser feita com autorização expressa dos detentores destes direitos autorais (minha mãe e meu tio).

Desta forma, espero contar com a sua colaboração no sentido do entendimento dos fatos acima expostos.

Qualquer dúvida estou às ordens.
Um grande abraço
Daliana Cascudo

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

ACTA DIURNA

Caríssimos amigos e leitores. A partir de 2010, estaremos publicando as famosas ACTAS DIURNAS do nosso mestre maior Luiz da Câmara Cascudo. Iniciaremos com Pedro Velho, Tavares de Lira e Felinto Manso Maciel.





QUE QUER DIZER “ÁCTA DIURNA”

Luís da Câmara Cascudo

Perguntaram a mim porque dei semelhante título a esta secção. Que quer dizer ACTA DIURNA?
ACTA DIURNA era uma espécie de jornal diário, uma folha onde os acontecimentos do dia eram fixados pelas autoridades de Roma, para conhecimento do povo. Pregavam-na a uma parede num dos edifícios do FORUM.
No ano 131, antes de Cristo, já existia a ACTA DIURNA, informando ao cidadão romano as "novidades" ou diretivas governamentais.
Júlio Cesar, cinquenta e nove anos antes do nascimento de Cristo, tornou a ACTA DIURNA oficial, de aposição obrigatória num determinado logradouro público.
Conservo o título em latim. Por isso aparece o ACTA com a segunda consoante do alfabeto.
ACTA significa, no latim, ações, obras, feitos, façanhas. DIURNA é o que se pratica sob o sol, no espaço de um dia, ou diariamente.
Suetonio, que bem conheceu a ACTA DIURNA, dizia-a efemérides diárias, o registro dos sucessos mundanos, políticos e administrativos, sociais ou literários.
A minha é uma ACTA DIURNA que recorda o pensamento que presidiu meu dia. Fixo a minha impressão diária, sobre um livro, uma figura ou um episódio, atual ou antigo.
Dei-lhe batismo latino porque a intenção cultural é honrar o passado, nas suas lutas, alegrias, tragédias e curiosidades. E, se matéria nova aparece, comentada, é ainda o desejo de conserva-la no Tempo para os olhos amigos de alguns leitores fieis, nas páginas tradicionais d’ “A REPÚBLICA”, o mais velho dos jornais conterrâneos

Natal, 03 de agosto de 1943

(transcrição ipsilitere do Livro das Velhas Figuras)

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

Olá Ormuz foi com grandes saudades que relembrei da Pipa da minha infância pois passamos vários veraneios lá no casarão, Tio Paulo sempre nos acompanhava juntamente com a sua noiva Júlia.Quis Deus que o meu adorado pai partisse tão cedo o que causou enorme tristeza em mim, minha mãe Lucila e meus irmãos Cabralzinho e Odilon e que nos afastou por completo dessa praia que ele tanto amava.
Parabéns pelas crônicas.

15 de dezembro de 2009 20:44

Marilia Cabral Barbalho Chaves
Natal RN

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

Ormuz:
Sem medo de errar, é um dos melhores textos do ano!
Parabéns e Feliz Natal!
Abrace o Dante.

Bartolomeu Correia de Melo (Bartola)
Natal RN

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS

ORMUZ BARBALHO SIMONETTI (Presidente do Instituto Norte-Riograndense de Genealogia-INRG e membro do IHGRN) www.ormuzsimonetti@yahoo.com.br

PUBLICADA EM “O JORNAL DE HOJE” EDIÇÃO DE 18.12.2009

PIPA – Veraneios inesquecíveis

Foram muitos os veraneios que deixaram saudade. Em minha adolescência lá pelo início dos anos 70, os mais afortunados já possuíam uma radiola portátil Phillips que funcionava a pilha. Aquela, do tipo maleta, que a própria tampa servia como auto-falante. Com esses modernos aparelhos fazíamos freqüentemente e sempre após o jantar, festinhas conhecidas como “assustados”, onde dançávamos ao som de Roberto Carlos, Renato e seus Blue Caps, Elis Regina, Chico Buarque e outros cantores do tempo da Jovem Guardam. Vez por outra, alguém conseguia com os pais, depois de muita recomendação, algum disco em 78 rotações ou os modernos LPs com músicas cantadas pelo velho Nelson Gonçalves, Anísio Silva, Silvinho, Altemar Dutra, Sílvio Caldas, e até de Dick Farney e da divina Elizete Cardoso, os mais difíceis. Estes eram escolhidos pelas músicas mais lentas que dançávamos a luz de velhas lamparinas a querosene.

Os que preferiam dançar samba, traziam discos de Miltinho, Demônios da Garoa, Wilson Simonal, Ataulfo Alves, Noel Rosa e tantos outros. Achavam o bolero mais difícil de dançar, mesmo conhecendo a velha regra: dois prá lá, dois pra cá, posteriormente imortalizada na canção de João Bosco e Aldir Blanc na voz da inesquecível Elis Regina. Esses “assustados” eram raramente feitos nos alpendres das nossas casas. Na maioria das vezes, para fugir das vistas de nossos pais, sempre atentos aos que dançavam com mais ousadia, conseguíamos, com muito jeito, a sala das casas dos nativos que ainda moravam na rua de baixo. O local era bem mais aconchegante, o chão de barro batido, lamparina em cima de tamborete ou pendurada em esteios da parede de taipa.

Ainda lembro-me dessas lamparinas penduradas nos enxaiméis, tisnando a parede e exalando aquele cheirinho característico da queima do querosene. Ali, a presença de curiosos era praticamente nenhuma. Nessas saudosas casas de reboco, além de ficarmos protegidos da vista dos curiosos, sabíamos que nossos pais não se abalariam de suas redes nos alpendres para nos vigiar, afinal de contas, não havia motivos para preocupação, já que éramos todos primos. Além do mais, estavam mais interessados nos carteados, sempre muito disputados ou nas animadas conversas políticas.

Lá pelas 10 horas da noite, depois que nossas parceiras se recolhiam, íamos para a beira da praia jogar conversa fora, tocar violão, ou mesmo programar alguma traquinagem.
Uma das preferidas era o roubo de galinhas, que sempre terminava na casa do saudoso Deda, que sempre nos recebia com aquele sorriso largo onde orgulhoso, exibia um enorme e cintilante dente de ouro.

Esse personagem, que é parte importante da história da Pipa, teve no boca-a-boca um grande aliado na divulgação de sua arte na cozinha e também como senhorio. Alugava, por preços módicos, cômodos de sua modéstia moradia onde hoje funciona a “Pousada da Bárbara”. Costumo dizer que ele foi o primeiro dono de pousada naquela região. Essa condição o tornou muito conhecido, inclusive internacionalmente. Os poucos “gringos” que chegavam à Pipa, logo perguntavam por Deda. Com aquele sotaque esquisito e falando bem enrolado com se a boca estivesse cheia de línguas, logo conseguia pronunciar o som daquelas quatro letras mágicas que tinham o poder de resolver os principais problemas daqueles longínquos visitantes: lugar pra dormir e boa comida a base de peixe e frutos do mar, abundantes naquela época.

As brincadeiras de roubar alimentos dos veranistas sempre estiveram entre as nossas preferidas, pois naquela época, tudo tinha que ser trazido de Natal, ou esperar o domingo pra comprara na feira de Goianinha. As bodegas da Pipa pouco ofereciam. Vendiam exclusivamente os gêneros alimentícios comuns à população local.

Certa vez, numa manhã de véspera de Natal, a turma de “biriteiros” apareceu na residência do casal, Veneide e Elviro. Já vinham naquela peregrinação de casa em casa, tomando todas e conversando miolo–de-quartinha. Lá pras tantas, meu irmão Dante Simonetti, em uma das idas ao banheiro, observou que em cima da geladeira se encontrava, totalmente indefeso, um apetitoso queijo do reino ainda lacrado, naquela conhecida embalagem redonda. Lá estava ele, imponente como se quisesse tomar o lugar cativo do famoso pingüim. Diante daquela visão, Dante não se conteve: quando retornou do banheiro, passou direto para sua casa que ficava praticamente vizinha, e o queijo. . . desapareceu.

Lá para as tantas, quando saímos da casa de Elviro, fomos surpreendidos com o convite de Dante, que já nos esperava no portão, para que fossemos à sua casa, retribuindo assim a visita. Lá, o principal tira gosto era queijo do reino que partido em generosos pedaços, foi avidamente consumido pelos presentes, já que esse tipo de tira-gosto normalmente não fazia parte do nosso cardápio de “paredes”.

À noite, quando preparava a mesa para a ceia de Natal, a ingênua prima Veneide deu pela falta do queijo. Depois de por a casa de cabeça para baixo, e não encontrando o que procurava, repetia sem parar: “Elviro, tenho certeza que o coloquei em cima da geladeira. . . Não é possível que um rato tenha levado o queijo com embalagem e tudo . . .”

No dia seguinte o delito foi revelado numa animada conversa na própria casa do casal, que depois de boas risadas, ainda se sentiu privilegiados por ter, pelo menos, participado da farra onde o “JONG” foi consumido e muito elogiado por todos.