ORMUZ BARBALHO SIMONETTI(Genealogista e historiador)
PIPA, os primeiros veranistas
A aristocracia canavieira de Goianinha escolhia, todos os anos, o mês de janeiro, para veranear na praia de Tibáu do Sul. Lá veraneavam os proprietários dos Engenhos: Bem Fica, Odilon Barbalho; do engenho Sumaré, Ezaúl Marinho; do engenho Bom Jardim Antônio Bento de Araújo Lima; o do engenho Ilha Grande Manoel Duarte da Silva; de engenho Cametá, Felipe Ferreira da Silva; do engenho Bosque Basílio Basiliano Barbalho; do engenho São Miguel, Benjamin Simonetti e outros.
Durante o inverno de 1924, ocorreu o rompimento da barra que separava a lagoa de Guaraíras das águas do oceano. Como a cidade se desenvolvera próxima ao mar, foi praticamente toda destruída, juntamente com as casas dos veranistas. A partir dessa data, as águas da lagoa de Guaraíras ficaram, definitivamente emendadas com o mar.
Impossibilitados de continuarem a veranear em Tibáu, em virtude do acontecido, escolheram então a praia da Pipa que ficava no mesmo município e a poucos quilômetros em direção ao sul.
O primeiro veraneio ocorreu em 1926. As casas a serem ocupadas eram conseguidas com os pescadores que, na maioria das vezes, saíam de suas moradas para alugar ou mesmo emprestar aos que chegavam. Iam morar temporariamente com os parentes. Eram casas muito pobres, construídas com madeira conseguida na região e cobertas com palhas de coqueiros. As paredes eram revestidas de taipa e, em alguns pontos, havia somente palhas de coqueiro. O banheiro junto com a latrina ficava separado da casa, lá no fundo do quintal. Escolhia-se uma área com cerca de dois metros quadrados onde se fincava quatro barrotes no chão e as paredes era feitas com palhas de coqueiro.
A latrina, como eram chamados os sanitários de antigamente, nada mais era que um buraco escavado no chão onde se atravessava uma tábua para facilitar o uso. Conforme a utilização e à medida do necessário iam sendo aterradas, com a própria areia retirada inicialmente.
A viajem de Goianinha até a praia da Pipa era muito penosa e demorada. As pessoas viajavam em carros puxados por juntas de bois, em lombos de animais ou mesmo acomodados dentro de caçuás que eram transportados por burros. O caçuá é um cesto grande e comprido, feito de cipó, sem tampa e com alças para prender às cangalhas dos animais de carga. Neles eram transportados, além de gêneros alimentícios, roupas e utensílios domésticos que seriam utilizados durante o período do veraneio.
Minha mãe conta que, quando pequena, fez diversas viagens para a Pipa, dentro desses cestos. Ela era acomodada de um lado e, do outro, ia meu tio Antônio Barbalho, tio Tonho, que era mais ou menos de sua idade, havendo assim uma melhor distribuição de peso. Quando a finalidade era o transporte de pessoas, estes cestos eram forrados com roupas, lençóis e toalhas para melhor conforto dos ocupantes. Com a continuidade dos veraneios as picadas se transformaram em estradas rudimentares mas que permitiam que os senhores de engenho, viajassem em seus “cabriolés”. Esse tipo de transporte, era uma espécie de carruagem coberta, com quatro rodas de madeira, parecida com as diligências do velho oeste americano.
Havia espaço para quatro pessoas na parte coberta e na parte externa, onde viajava o cocheiro, cabia mais uma pessoa. Eram puxadas por dois cavalos. Nos cabriolés, viajavam geralmente o senhor de engenho com sua esposa e, às vezes, alguma criança de colo.
Em Goianinha os engenhos Bem Fica, Ilha Grande, Cametá, Bom Jardim e Mourisco, possuíam esse tipo de transporte. Outros tinham charretes, que eram veículos menores e mais leves, também de tração animal. Não tinham cobertura e o assento comportava no máximo três pessoas, incluindo aí o condutor.
Quando era criança, tive oportunidade de viajar no cabriolé do engenho Bem Fica. Foi uma viagem curta mas inesquecível. Viajei do engenho até Goianinha. Ainda hoje posso sentir a emoção dessa viagem. O cabriolé puxado pela parelha de cavalos russos, Mele e Medalha, seguia estrada afora, estimulados pelos gritos e estalidos de chicote do cocheiro João de Gerson. Quanta saudade!
Essa crônica faz parte do livro “A PRAIA DA PIPA DOS MEUS AVÓS, a sua verdadeira história”. De autoria de Ormuz Barbalho Simonetti, tem publicação prevista para o ano de 2010.
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