Casa de Maurínio Sena.
Numa dessas ocasiões, a instalação da bomba foi na casa de Maurínio Sena. Como ele ainda não havia feito o poço, que na praia era conhecido como “poço tubular”, por ser feito com tubos de PVC, o equipamento seria instalado numa cacimba. Começamos o serviço na hora marcada e com pouco mais de hora e meia de trabalho o equipamento já estava pronto para funcionamento. Foi nesse instante que começou toda a malandragem, que nos era comum: alguém deu um jeito de afrouxar uma das conexões que ficavam longe das vistas dos curiosos e isso provocou a entrada de ar no sistema, impedindo seu funcionamento. Foi então feita uma pausa para o descanso que veio, como de costume, acompanhada das bebidas e dos petiscos.
Depois de várias horas de descanso, sempre alguém se oferecia para resolver o “problema”, mas nunca encontrava o tal defeito. Nesse dia especificamente, o problema só teve solução quando já escurecia e os técnicos, juntamente com outros participantes da farra, já bem “melados”, tinham devorado todo o tira-gosto disponível e já estavam tomando, como caldo, até mesmo a sopa que dona Lindalva, esposa de Maurínio, havia preparado para o jantar. E tudo isso com a devida cumplicidade do esposo, que era quem mais gostava dessas brincadeiras. Essa intimidade era comum entre nós.
Numa dessas farras na minha casa, Maurínio passava pela cozinha, retornando do banheiro, quando viu a mamadeira de leite que minha esposa tinha preparado para nossa primeira filha, hoje com 30 anos de idade. Não teve dúvidas, atacou a mamadeira e sem mesmo tirar o bico, tomou o mingau até o último gole, depois de mandar para dentro uma boa lapada de cana.
(Veneide, Ormuz, MAurínio, Evilásio, Dina e George)
Praia do Meio - Pipa RN
Inexplicavelmente, resolveu comemorar seu aniversário uma semana antes. Fez uma grande festa em sua casa e foi muito prestigiado com a presença de parentes e amigos. No outro dia, acordou mais cedo que de costume e não esperou pelo seu amigo e companheiro de caminhada, Edison Costa de Mello. Naquela manhã, resolveu caminhar sozinho. Seguiu no sentido da Pedra do Moleque e chegou até a praia das Minas, onde seu corpo foi encontrado por um grupo de turistas, que também fazia caminhada naquelas praias desertas, próximas à Praia de Sibaúma.
Praia das Minas - Pipa RN
Logo chegou a notícia na Pipa, e muitas pessoas da comunidade correram para o local. Eram homens, mulheres e até crianças que seguiam os pais, todos fizeram questão de ir ao local onde o corpo ainda se encontrava.
Depois que uma de suas filhas autorizou a remoção, os homens o puseram em uma rede e o conduziram, barreira acima, em terreno íngreme e de difícil caminhada, até a Pipa. O cortejo seguiu no mais completo silêncio, em respeito à dor dos familiares e amigos daquele que por tantos anos conviveu naquela comunidade, como se lá tivesse nascido. Tinha tantas mãos e ombros querendo ajudar naquela caminhada de volta para casa, que muitas vezes o pau da vela de um barco, que utilizaram para armar a rede onde conduziram o corpo, fora disputado por aqueles que seguiam o triste cortejo. Foi deveras emocionante essa demonstração de respeito e amizade. Várias pessoas na Pipa se ofereceram para trazê-lo de onde ele foi encontrado, em seu carro, percorrendo uma precária estrada que chegava próxima à Praia das Minas, o que foi prontamente recusado. Os amigos fizeram questão que o seu último retorno para casa fosse feito em seus ombros e braços. Queriam com essa atitude prestar a última homenagem ao amigo e companheiro que muito embora nascido em terras Pernambucanas, adotou aquele pedaço de chão como sendo a sua terra natal.